sexta-feira, 29 de abril de 2011

The English Dream

Antes de escrever esse post, eu me peguei pensando em como eu poderia introduzir o assunto que eu quero falar. Eu poderia fazer um enorme post descrevendo o surgimento do conceito de nacionalismo como doutrina e ideologia no final do século XVIII, citar alguns grandes autores e ensaístas da época para dar um respaldo intelectual, puxar um gancho para meter o pau em algum aspecto que supostamente considero decadente da sociedade brasileira contemporânea (acho que alguns leitores mais erráticos do blog realmente acreditam que eu tenho um globo terrestre na minha casa onde todo dia antes de dormir eu espeto uma agulha no mapa brasileiro falando "Terrinha maldita! Deuses da Economia, mandem uma crise para esse país de quinta e façam com que essa classe média medíocre passe a não ter dinheiro nem para passar um final de semana em Pedro Juan Cabellero!", passo a mão suspirando "Um dia eu volto, um dia eu volto..." por todas as estrelinhas douradas coladas sob as capitais européias que eu conheci, desligo a luz do quarto e vou dormir abraçado com um travesseirinho com fronha "I (heart) Europe"), fazer alguma previsão pessimista-deprimente-catastrófica sobre os próximos acontecimentos e terminar o post com uma mensagem de esperança para não deixar os meus leitores muito deprimidos e tentar aliviar um pouco a minha fama de "chato-corta-barato".

Mas obviamente a forma informal de começar a falar o que quero é BEM mais interessante. E enrolar lingüiça para tentar pagar uma de intelectual 'meu-maior-sonho-é-fazer-mestrado-sobre-os-trabalhos-de-(inserir nome de autor de nome difícil, com trabalhos controversos e textos absolutamente impossíveis de ler)' é algo que eu já faço diariamente na minha querida faculdade de Economia, portanto... não preciso fazer isso aqui no blog e... lá vai!

(Primeiro, imagina uma coisa 'campo florido', uma coisa Grieg, uma coisa 'comercial de perfume floral francês'. Foi? Não! Não rola imaginar Holambra porque interior de São Paulo logo vai desembocar em Monteiro Lobato, Sítio de Picapau Amarelo com aquela dona Benta chata entupindo todo mundo de comida gordurosa, tradições do interior brasileiro e quando você menos esperar Barretos vai aparecer e vai foder com o que eu quero que você pense. Tem que ser campo florido de região de clima temperado. Rola imaginar Rio Grande do Sul - se na cidade próxima não tiver Festival da Uva/Maçã/Lichia Fúcsia nem Rainha/Princesa do Festival tentando convencer que vale super a pena viajar até Porto Alegre/Curitiba/Florianópolis, se enfiar num carro por 20503 horas para chegar numa cidade perdida no meio do nada e comer 20504 variações do mesmo legume/fruta nas mais diversas e calóricas possibilidades.)

Em algum momento do século XVIII, as grandes nações européias caíram na real que a lânguida-virgem-e-frágil-camponesa-louca-para-dormir-com-o-tratador-de-cavalos-do-vilarejo era absolutamente iguais na Normandia, na Baviera e na Jutlândia - impossíveis de distinguir uma da outra. Perceberam que precisam denominar uma fronteira, um idioma, uma capital para cada um dos países que eles tinham na cabeça. E claro, o mais importante: inventar uma série de tradições, lendas, mitos e valores que cada uma das queridas nações européias deveria representar.

E nisso os franceses saíram pegando logo o conceito de luxo, sofisticação e finesse (confessa que não dá para imaginar que um lugar com um nome tão chique como "Noisy-Le-Sec dans Seine-Saint Denis" é isso); os alemães, o conceito de burguesia intelectualizada, esclarecida e filosófica (rá-rá-rá); os italianos, a tradição representada pelo Império Romano e a sofisticazione representatta per il idioma italiano; e daí para frente.

Obviamente os ingleses não ficaram para trás. Olharam para o diabo daquelas ilhas chuvosas-e-cheias-de-ovelhinhas, pensaram na bosta que era ainda ter que dividir aquilo tudo com povos super civilizados como escoceses, irlandeses e galeses e ter que fingir que Edimburgo, Dublin e Cardiff super eram tão importantes como Londres. Olharam para o outro lado do Canal da Mancha, viram os franceses dando uma esnobada para eles, pensaram "Isso vai dar merda, temos que unificar essa porra aqui.", até que... provavelmente algum Lorde em alguma sessão levantou a mão e disse "Já sei! Vamos complicar ao nível do absurdo qualquer aparição daquele inútil do Hampton Court Palace! O símbolo britânico vai ser a Família Real! O símbolo britânico vai ser o protocolo!".

Daí já viu: algum inglês perdido em alguma manufatura inventou alguma máquina a vapor que deu meio certo, a Inglaterra ganhou rios de dinheiro, percebeu que o maravilhoso exemplo de administração das próprias Ilhas Britânicas tinha que ser repetido em outros lugares do mundo, simpaticamente convidou a Índia e metade de África para tomar chá todo dia com eles, começou a arranjar quizumba com os franceses, começou a arranjar quizumba ainda maior com os alemães, se fudeu porque o povo missionário-mala do Mayflower copiou todas as máquinas deles e ficou ainda mais bafônico e rych do que eles, metade das colônias resolveram ser pobres e miseráveis sem o passaporte britânico (e ter a emoção de poder imigrar legalmente para o Reino Unido!), Londres passou a ser uma cidade cool-but-not-so-cool-as-NYC e ponto final.

Mas depois de todo esse tempo a merda já estava feita, e o mundo estava convencido: os britânicos eram os representantes mais fleumáticos do protocolo. E as imagens de uma família britânica branca-loirinha-e-dentucinha (absolutamente indistinguível da Família Real da Áustria, Rússia, Espanha ou Alemanha) acenando da sacada do Buckingham Palace, roboticamente impecável-simpática-e-grata-pelos-contribuintes-não-terem-os-decapitado (França tá ali do outro lado, gente!), cerimônias cheias de firulas e sem o menor sentido prático e funcional em democracias modernas e esclarecidas mas que supostamente remetem a tradições milenares criadas no século XVIII e banquetes onde Lordes e Ladies de Cheddarham ou Fuckinghamshire comparecem e as mulheres sustentam absurdos-e-cafonérrimos chapéus correm o mundo. Em nossas simples repúblicas, semelhantes farras faraônicas com o dinheiro público levariam a processos, provocariam indignação popular, impeachments ou derrota do presidente nas próximas eleições. No reino encantado das Ilhas Britânicas? Provocam um suspirinho de "Ah, como é romântico ter uma Família Real como os ingleses tem...".

Semana passada em Paris eu me deparei com um dos periódicos mais lidos das terras gaulesas estampando na capa uma foto de Kate e William e uma manchete "British so Cool". Basicamente uma lista, escrita por jornalistas franceses, dos motivos pelos quais os britânicos eram muito mais cool do que os franceses. Dois minutos de choque (Francês elogiando inglês? Que porra é essa?!) precedidos de uma rápida olhadela ao redor para uma Rue des Martyrs absolutamente deslumbrante sob um céu completamente azul de primavera e parisienses casualmente bem-vestidos comendo+fumando do lado de fora de elegantes pequenos bistrôs e a minha cara de "Como os ingleses são mais cool que os franceses?!". Tudo bem, eu sei: auto-flagelação e reclamar da 'decadência da sociedade francesa contemporânea' são atividades nacionais francesas favoritas e a França não se restringe ao arrondissements elegantes de Paris. Mas ao mesmo tempo (e todo mundo que teve amigos ingleses pode confirmar), por que diabos sempre acabamos associado ao conceito "Britânico" uma imagem fina-refinada-e-trenchcoatiada e nunca a imagem que todo mundo sempre mais vê em Londres?!

Enfim, tudo isso para dizer que acho muito bonitinho as thousands Union Flags espalhadas por Londres, muito simpático todo aquele povo farofeiro-cheio-de-dente-mal-tratado acampando em frente ao Palácio de Buckingham para ver um monte de batedor da Polícia Inglesa cobrindo o Rolls-Royce da noiva, muito interessante o fato de que o vestido que Katherine Middleton irá utilizar é um assunto mais importante para a Folha (e pelo que parece, para o mundo) do que o massacre que as tropas do Gaddafi estão provocando em Misrata. But, engolir soft power britânico e ficar bradando bandeira britânica e suspirando pela pompa e tradição britânicas não rola. Londres é absolutamente imperdível, a Inglaterra é fofissimamente vários dos clichês que eu tinha criado na minha cabeça antes de ir e toda a tradição imperial realmente é legal e vale a pena ser vista e compreendida. Mas comprar esse idéia de que britânico ainda é um povo educado que toma chá às cinco e que é aquela imagem inatingível de formalidade e sofisticação... no way. Não tenho paciência nem saco.

(Que sobrevivemos ao dia de amanhã, dear Lord...)

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Arrêtez tous les bonnes boissons!

Ok, pequeno quiz para os meus leitores.

Pergunta: Onde estou?

Dicas:
#1: Eu consigo chegar do aeroporto a cidade pegando um simples trem (ja o mesmo nao se pode dizer do Rio, neam? Pqp - demorei quase 2 horas + um taxista que me enrolou para sair da ZS e chegar naquele diabo chamado Ilha do Governador. Num trajeto que normalmente demora 30 minutos, mas que consegue a facanha de pegar tanto o engarrafamento de quem entra e de quem sair do Rio! Detalhe: morri uma fortuna no taxi para nao chegar atrasado... e o voo saiu 30 min porque a "tripulacao ficara presa num engarrafamento". Sweet...)
#2: Tem restaurante indiano na esquina. E logo depois, um antilhano. E por perto, um ruandes. :D (Ou seja: PF de bife de contra-file com batata-frita my ass!)
#3: Eu estou usando trench-coat. E barra da calca dobrada. E cachecol. ;D (E ninguem torra a minha paciencia que eu estou de crossover de "ingles com calca de Chico Bento" porque isso é IN aqui... :D)
#4: Tem uma H&M por perto. (O QUE? TEM UMA H&M POR PERTO?!)
#5: Fernando esta absurdamente feliz porque esta lembrando de uma parte dele que estava latente ha meses: a curiosidade de perceber com o outro pode ser tao diferente... e tao fantastico. :D


E ai? Deu para descobrir?

(Ah, dica #6: Na porra desse lugar os teclados tem uma ordem diferente, o que torna escrever uma atividade total "Tia cega catando milho".)

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Elegance is about the way you cross your legs, not the label or the newest clothes from the latest collection

Raríssimas as vezes eu postei aqui um artigo ou entrevista na íntegra (aka. 'nome elegante e jornalisticamente sofisticado para o processo de ctrl v + ctrl c'). Mais raro ainda (ou inédito no blog?) um post sobre moda, um assunto que sinceramente me interessa bem mais do que eu deixo expressar pelos meus textos aqui no blog.

Mas algumas matérias necessitam ser divulgadas, necessitam ser espalhadas, necessitam ser lidas. Por que então eu acho que a entrevista de Carine Roitfeld para a Spiegel Online International merece isso?

#1: C'est Carine Roitfeld, chérie: Como?! Não sabe quem é ela? (Primeira reação choque + Pensamento 'Em que planeta você mora, dear? Planet Girls?!', Segunda reação: Respira fundo, ajeita a camisa social e vai) Sabe o 'Diabo veste Prada'? Sabe Miranda Priestly (meu sonho é virar um chefe e despachar os meus subalternos+estagiários com um seco 'That's all."), o papel da Meryl Streep? Então, ele foi inspirado em Anna Wintour, a toda-poderosa editora-chefe da Vogue Norte-Americana - uma excelente profissional, com um poder absurdo na mão, que catapultou as vendas da Vogue America para a estratosfera, bla bla bla. Mas que vamos combinar: ainda é a Vogue America - onde que americano é um povo conhecido pelo estilo de se vestir?! (Afinal, EUA é o país disso, disso e disso.) Carine Roitfeld é simplesmente a equivalente de Anna Wintour na Vogue Paris, petit. P-A-R-I-S. Primeiro, ocupou o cargo da principal revista de jornalismo de moda na capital de moda mundial (Paris, dã?!). Segundo, ela conseguiu catapultar as vendas da Vogue francesas em um momento de recessão das grandes editoras e ao mesmo tempo estabelecer a Vogue francesa como a publicação internacional quando se trata de inovação e originalidade em termos de jornalismo de moda. (Impossível comparar a o climinha "Quem Acontece meets Bloomingdale's" da Vogue America com os absurdos promovidos por Mme. Roitfeld na Vogue Paris.). Terceiro, ela é inteligente, ousada, fala merda e literalmente rocks. (Preciso realmente afirmar o quanto eu acho ela foda?). E quarto: assez.

#2: Sentir a essência do que é a moda da perspectiva de uma francesa: Primeiro que 'moda' é uma palavra que não faz sentido para um francês - eles preferem definitivamente usar o conceito de 'estilo'. Segundo, c'est bien: você pode argumentar que franceses não curtem um banho (falando francamente, até hoje eu ainda não encontrei um francês fedidinho - agora, meu querido, dá uma passada no trem ramal Japeri no horário de rush do final da tarde...), que já viu vários turistas de France absurdamente mal-vestidos dando pinta por Ipanema/Copacabana e até que Christian Audigier é francês. (Agora eu fico feliz se você não sabe quem é Christian Audigier: ele é o Cocô Chanel do creyçon fashion style no Primeiro Mundo, sua marca Ed Hardy é absolutamente idolatrada por todas as celebs Z-List Europa e EUA afora e suas roupas tem o maravilhoso pode de te deixar instantaneamente tão elegante quanto um integrante de gang de rua de subúrbio de San Diego. Resumindo: na hora em que chegar a primeira camisa no Brasil, será sucesso de vendas instantâneo.) Mas é inegável que a 'moda' é uma característica fundamental da cultura francesa. E indispensável da cultura urbana parisiense - eu não diria exatamente que os parisienses são os mais bem-vestidos (dentre as cidades que eu conheci na Europa, esse título segue fácil para Estocolmo - os escandinavos em geral tem um senso estético muito apurado para tudo o que envolve 'design', mas os suecos facilmente são os que mais aplicam isso em termos de 'estilo de se vestir': não é somente um 'usar roupas caras', mas um senso de saber escolher, saber combinar itens a primeira vista comuns e construir com o conjunto um visual essencialmente moderno e trendsetter), mas existe algo no jeito de vestir do parisiense em geral que atrai o olhar de qualquer um que visita a cidade. É um estilo clássico, simples, focado em peças básicas com acessórios de impacto, que quase sempre resulta num estilo que poderia ser classificado como 'casual sofisticado'. Descrevendo assim parece algo 'uniforme', eu sei, mas andando por Paris é incrível como você consegue ver isso em estilos/tribos tão absurdamente diversos, do bohemian ao gótico. Tudo relacionado à um equilíbrio: not too much (italiano demais) a ponto de transmitir informação demais sobre você, not way too less (americano por essência) a ponto de o que você vestir não passar impressão/imagem/idéia nenhuma sobre quem você é. Resumindo o paragráfo gigante que eu acabei de escrever: de forma geral, o francês tem uma noção de que moda é uma das formas mais efetivas de passar uma mensagem pessoal para o mundo - e eles pensam sobre isso.

#3: Para relembrar que jornalismo de qualidade consegue transformar um tema que tão facilmente desbanca para a futilidade tipo 'o-novo-preto-da-estação-é-o-oncinha'/'oh-como-somos-fúteis!' em algo realmente intelectualmente interessante de ser lido: Sendo muito sincero, desconheço qualquer meio de comunicação escrito no Brasil que teria a capacidade/coragem de fazer uma pergunta como 'Can anyone who has spent 20 years in the fashion industry still be normal?' e acho que temos que reconhecer: mídia escrita de grande circulação, no Brasil, com qualidade para ser lida deixou de exisitr há muito tempo. Depois que a Folha passou a 'Crise Árabe' inteira ridiculamente traduzindo textos das grandes agências internacionais de notícias e destacou um time de jornalistas/escritores para discutir o BBB, acho que ficou mais do que sublinhado o fim da Folha como um jornal efetivamente com conteúdo. Em fúcsia. E itálico.

#4 Deswegen habe ich fucking Deutsch gelernt: Dois anos indo estudar alemão no CLAC (toda segunda e quarta, as 7h30!) na ilha do Fundão (@For-não-cariocas: Uma ilha longe longe, muito longe, muito muito longe, praticamente com microclima próprio, impossível de se chegar nos horários de rush, onde ficam a maior parte dos cursos ds UFRJ) + 5 anos de Goethe Institut (#1: Para dar uma dimensão da coisa, quando eu comecei a estudar no Goethe a moeda alemã ainda era o marco; #2 Cinco anos aturando os alunos insuportáveis de Germanística, que ficavam competindo quem decorava a declinação de mais prepsições; #3 O curso inteiro dura 10 anos. D-E-Z-A-N-O-S. Deprimente pensar que em 10 anos quem aprendeu inglês consegue praticamente escrever uma tese de doutorado - quem aprendeu espanhol, uma tese de doutorado em estudos comparados da antropologia do século XVII - e quem aprendeu alemão... consegue falar bem alemão.) + 1 ano de Alemanha (Onde primeiro eu me deprimi ao perceber que 7 anos de alemão me ensinaram a basicamente gaguejar em alemão, depois comecei a decifrar razoavelmente o que a maioria das pessoas falavam - já participou de uma reunião de duas horas onde você tinha que escrever uma ata e basicamente conseguiu entender somente o "Bom dia, estamos aqui..."? Eu já. No meu primeiro dia do estágio novo. - e ao final eu conseguia... me comunicar em alemão... mas tinha finalmente entendido que Hitler não ganhou a Guerra porque alguma força superior existe e não deixou o alemão se tornar a língua franca mundial que falar aquela Scheiße de idioma fluentemente somente nascendo na Alemanha.) = Determinado conhecimento do idioma alemão. Por que? Eu também não sei explicar. Mas, sendo muito sincero, ter acesso à imprensa alemã justifica muito desse esforço: a qualidade e a profundidade das matérias dos semanários alemães é impressionante. São páginas e mais páginas (a Spiegel média quase sempre fica pelas 400 páginas) de matérias que vão a fundo em temas relevantes, colunas com especialistas que realmente entendem do tema dando opinões fundamentadas (alemão adora um "Argumentos a favor" e "Argumentos contra" para qualquer assunto) e entrevistas onde os jornalistas não se intimidam nem por um segundo em fazer as perguntas desconfortáveis que todo mundo quer saber as respostas. Obviamente também existe publicação no estilo 'Meia-Hora' na Alemanha (Bild, for sure) e o que todos os elogios escritos acima são para a chamada tríade-de-ouro da mídia impressa alemã (Die Zeit, Der Spiegel e Frankfurter Allgemeine - os dois primeiros publicados em Hamburgo :D). Mas mesmo entre os equivalentes nos outros países europeus (com a exceção do excelente The Guardian - onde eu li e fiquei sabendo dessa matéria através da coluna de Life & Style chamada Fashion Statement), os jornais alemães são insuperáveis. Assim como os automóveis. E a obsessão por pontualidade e eficiência. :D

E agora, chega de introdução e voilá a entrevista com Mme. Roitfeld (muita emoção, muita emoção):

SPIEGEL: Ms. Roitfeld, you were editor in chief of the French edition of Vogue, the fashion and lifestyle magazine, for 10 years. Before that, you worked for 10 years at Gucci alongside then-creative director Tom Ford. Can anyone who has spent 20 years in the fashion industry still be normal?

Carine Roitfeld: My only drug is a small glass of vodka in the evening, if that's what you're asking. But I was fortunate because -- in addition to the very special world of fashion -- I also had a family, which is something probably rare in this business. I have also been married to the same man, the father of my two children, for more than 30 years. And that has helped me remain relatively normal.

SPIEGEL: For a former Vogue editor in chief, you also look remarkably normal.

Roitfeld: That's part of my newfound freedom. I always wore a tight skirt at Vogue; it was like a uniform.

SPIEGEL: Can you tell us what you're wearing today?

Roitfeld: A no-name T-shirt from Los Angeles, corduroy jeans by Current Elliot and satin shoes I had custom-made in violet. So the glamour's limited to my feet.

SPIEGEL: Does this world of vanity, in which fortunes are spent on trivial things, corrupt people?

Roitfeld: The fashion industry certainly has its obscene sides. The cost of a coat can be obscene. So can the cost of a photo shoot if you're working with a really good photographer. But when I see how good the photos have turned out or even how well the coat was made or how many people worked on it, it's not quite so obscene anymore. Of course, it's not like we're working in a hospital; we don't save lives every month. We just make decisions about skirt lengths, about an inch more or an inch less. That's all.

SPIEGEL: Did that ever seem pointless to you?

Roitfeld: For 10 years, it was a hell of a lot of fun. But, toward the end, it unfortunately got less and less fun. You used to be able to be more playful, but now it's all about money, results and big business. The prêt-à-porter shows have become terribly serious. The atmosphere isn't as electric as it once was, and they now have about as much charm as a medical conference. But it takes just one good fashion show to get things exciting again.

SPIEGEL: If fashion can tell us anything about the age it's created in, what do you think current fashions tell us?

Roitfeld: Today's fashions don't let people dream as much as they used to. Twenty years ago, fashion was a promise -- something that was part of your life and perhaps enriched it, something that reflected a particular era. If you look at advertisements these days, all you see are handbags. They aren't about dreams anymore; customers are buying objects now, not dreams.

SPIEGEL: Is that why you left Vogue in January?

Roitfeld: Ten years is a long time -- and especially 10 years in a gilded cage. They were wonderful years; but, sooner or later, birds want their freedom again.

SPIEGEL: Your French publisher said the time for being provocative and trashy was over.

Roitfeld: I'd put it this way: Fashion needs glamour, provocation and broken taboos.

SPIEGEL: Was it your decision to go?

Roitfeld: Absolutely. And at the perfect moment. The French edition of Vogue had never been more successful, had never had more readers or advertisers. And it had never made as much money. For 10 years, my American publisher, Jonathan Newhouse, let me do what I wanted, even when he thought it might be crazy. But it couldn't have gone on for much longer.

SPIEGEL: Is this the end of era?

Roitfeld: Creativity needs space and a willingness to take risks, but businessmen don't like risk. What's more, designers are coming under more and more pressure. Today, a dress can't just please the women in Paris; it also has to please those in Beijing, Tokyo, Moscow and New York.

SPIEGEL: Is globalization making fashion more boring?

Roitfeld: At the very least, it's leading to a lot of compromise. But globalization is only one factor. Today's designers no longer have to create two collections a year; they have to create four: spring, summer, fall and winter. And some fashion houses also add haute couture twice a year. Who can possibly manage all that? Good designers are artists; they're fragile people.

SPIEGEL: Two of the biggest stars in the Paris fashion world, Britons Alexander McQueen and John Galliano, both left this stage in a very dramatic way. McQueen committed suicide a year ago. And Galliano, the Dior designer, made his exit a few weeks ago after publicly professing his love for Adolf Hitler.

Roitfeld: McQueen's artistic creations always had a very dark side, but his death still came as a shock. After all, it's not like he was alone. He had a big team surrounding him, but it unfortunately wasn't able to protect him.

SPIEGEL: And Galliano?

Roitfeld: I had no idea how unhappy John Galliano must have been. You have to be very unhappy and lonely to praise Hitler in public while completely drunk. The House of Dior has always addressed a range of topics, for example, by having haute couture shows on homelessness where all the models look like people living on the street. But drunkenly shouting "I love Hitler" and calling people in a bar a "dirty Jew-face" is unacceptable. I don't think he really believes what he said; they were simply the actions of a drunk.

SPIEGEL: Are drugs an everyday part of life in the fashion industry?

Roitfeld: No more and no less than they are in other artistic circles. Yves Saint Laurent was the first person to openly admit to being a drug addict. Since I never touched drugs myself, I find it hard to tell whether people are taking them. But, of course, some people do. The industry has become faster and faster. People are constantly fighting jet lag and working through the night.

SPIEGEL: Now that Galliano and McQueen are gone, is German designer Karl Lagerfeld the only one left?

Roitfeld: Yes. Good old Karl. Superhuman Lagerfeld. I don't think he experiences this pressure in the same way. That's why he can put up with it.

SPIEGEL: And no one else can?

Roitfeld: He's not the only one. There's also Nicolas Ghesquière at Balenciaga, Riccardo Tisci at Givenchy, Miuccia Prada and, of course, Tom Ford. And then there are the up-and-coming talents. But they still need time. In a way, we've already seen everything. What else could they hope to invent?

SPIEGEL: And, in any case, copies of their designs soon turn up in Zara and H&M shops.

Roitfeld: Yes. At fashion shows, bloggers sit in the front rows and transmit new looks around the globe. It's all become terribly rapid. You're sitting in Paris, and people in Beijing already know what's going on. It's pretty crazy. But designers are probably really flattered that their looks are being copied.

SPIEGEL: But don't you think that this copying is still a problem?

Roitfeld: I don't see it that way. Fashion stopped being a matter of money a long time ago; it's a matter of taste. These days, even women with less money can dress well. I was always saddened by the idea that elegance was only something for a minority. It's about style. Karl was the first one to understand that. It was very smart of him to design this H&M collection, and very smart of Chanel to allow him to do so.

SPIEGEL: Today, it's mostly wealthy Russian and Chinese women who are buying expensive fashions. People working at many boutiques in Berlin speak Russian.

Roitfeld: That's right. This obsession with particular designers is somewhat strange. I think it's the safest way for these customers to find their feet when they first discover the world of fashion. You can't learn how to be elegant; you can only learn how to avoid mistakes. The rest is instinct. Elegance is about the way you cross your legs, not the label or the newest clothes from the latest collection.

SPIEGEL: Now you're undermining all the sales arguments your own industry makes.

Roitfeld: It's often the case that what a women reads makes her more attractive and more elegant than what she wears.

SPIEGEL: Do French women read more than German women?

Roitfeld: From a very early age, French women learn not to exaggerate. Yves Saint Laurent once said that the purpose of clothes is to make women more beautiful but that a coat must never attract more attention than the woman wearing it.

SPIEGEL: In France, you have a reputation for being the woman who invented "porn chic." Your photos were criticized because they showed young Lolita-type girls, pregnant women smoking and smooching seniors.

Roitfeld: Yes, of course. Fashion has to be given free rein and only a small number of restrictions. I never used any photos that my children shouldn't see; that was my benchmark. The little girls wearing makeup were never naked; it said "No Smoking" under the pregnant woman; and why shouldn't old people kiss? You must be allowed to play. Anything else is terribly boring. I've also painted white models black and later red, which (the French anti-racist NGO) SOS Racisme complained about.

SPIEGEL: Did you find that silly?

Roitfeld: It's absurd to accuse me of being racist. I dedicated an entire issue of Vogue to the black model Liya Kebede. I'm always looking for connections to real life. I once had a series of photos about fur; but, in these politically correct times, you can't even go out on the street in New York or London without getting a pie thrown in your face. The photos showed extras holding up posters of animal rights activists. It was meant to be ironic, but unfortunately not everyone got it. Why can't we wear the animals we also eat, such as sheep and rabbits?

SPIEGEL: You're 56 years old. How difficult is it for a woman to age in the fashion industry?

Roitfeld: Well, during photo shoots, you come across these beautiful 16- or 18-year-old women who have perfect bodies and not a single wrinkle -- but their pictures are retouched. Under these conditions, when you look in the mirror, you have to be happy with yourself, remain young at heart and keep that rock 'n' roll attitude. Otherwise, you won't be able to deal with it.

SPIEGEL: What will you do with your new life?

Roitfeld: I have numerous projects in the works: a book with Karl Lagerfeld, another about my own work, an ad campaign for Chanel and some consulting work for Barneys, the designer fashion store in New York. Who knows? Perhaps I'll become a muse for designers again.

SPIEGEL: So you won't take the place of your former colleague Anna Wintour at the head of the American edition of Vogue?

Roitfeld: That was never seriously under discussion. I like to provoke. I'm very French. In America, they're not even allowed to show a hint of nipple in photos. Anna Wintour is the most powerful woman in the global fashion industry, the first lady of fashion. She's a politician; I'm a stylist. They are two very different jobs. Incidentally, despite all the rumors, she is actually very nice.

SPIEGEL: Do you have any fashion principles?

Roitfeld: I don't change my handbag every season. I believe in the Yves Saint Laurent woman who either has her hands in the pockets of her pantsuit or is holding her lover's hand. She doesn't need a bag.

SPIEGEL: You also always wear high heels.

Roitfeld: Yes, they give you power. You move differently, sit differently and even speak differently.

SPIEGEL: So you never wear flat-soled shoes? Not even when going for a walk?

Roitfeld: I don't go for a walk very often. I wear flat-soled shoes on vacation, but I also travel in high heels, which is why I'm regularly stopped by customs officials at the airport. Wearing high heels in an airplane is suspicious. Nobody else does that.

SPIEGEL: Do you have any fashion tips for us?

Roitfeld: If you don't want to make any mistakes, buy black clothes. That's always good. And from age 50 on, you can slowly start adding a little beige. That's softer. Every five years, you should take a critical look at your own wardrobe and, if necessary, eventually swap your bikini for a one-piece swimsuit.

SPIEGEL: And, if necessary, eventually stop going swimming altogether?

Roitfeld: There comes a time in your life when you even have to consider that. You should always be one of the best, whatever your age group. That may mean staying away from the beach.

SPIEGEL: Ms. Roitfeld, we thank you for this interview.

Interview conducted by Claudia Voigt and Britta Sandberg

Fonte: Spiegel Online International > Zeitgeist

quinta-feira, 7 de abril de 2011

The Brazilians are coming!

Em um lindo dia de sol, certo amigo que eu defino como 'luso-americano-equatoriano' (praticamente um Pokemón mistura de americano com origens equatorianas que fala um português de Portugal assustadoramente excelente) embarcou no seu voo do trecho Nova Iorque-Houston por uma famosa companhia aérea americana. Além das usuais famílias de texanos voltando da Big Apple (quando vocês lêem 'família da texanos' vocês não imaginam uma coisa meio família Buscapé-pós-Poço-de-Petróleo, com aquele sotaque mega interiorano, roupinhas de oncinha com decotão, cabelão loiro e muito dourado tinlintintando que nem eu?), businessmen nova-iorquinos indo tratar de negócios relacionados ao petróleo em Houston (por que turisticamente Houston deve ser tão interessante quanto Campinas), a usual horda de latino-americanos a serem reenviados ao sul (devidamente abastecidos de Nike Shoxx e moletons GAP comprados nos Outlets dos States).

Meu amigo vêm ‘walking down by aisle’ quando percebe que ele fora agraciado por um lugar entre uma janela e corredor . Duas mulheres ocupavam os dois lugares, uma mãe por volta dos 50 e uma filha por volta dos 20, deixando o lugar dele vazio. Enquanto ele colocava sua bolsa na bagagem de mão, ele escutou:

Mãe (em bom português): Querida, vem sentar do meu lado.
Filha: Ah não, mãe! Quero ficar sentada aqui no corredor. Não quero nenhum desses americanos chatos atrapalhando a minha saída para o banheiro. O avião está vazio, ele que se manque e vá sentar em outro lugar...

Meu amigo ficou na dele, resolveu bancar a do “No-comprendo-português” e educadamente (em inglês) pediu para sentar no lugar dele. A filha, com um sorrisinho educado-nojentinho se levantou, meu amigo se sentou e abriu a revista de bordo. Nisso elas comentam:

Filha: Ah, americano não se manca, né? Também vou encher o saco dele até ele sair daqui... – Disse pegando a revista de bordo e praticamente jogando na cara do meu amigo– Olha aqui mãe, que bolsa LINDA!

A comissária já tinha percebido que iria rolar merda, veio e ofereceu para o meu amigo um lugar mais a frente. Meu amigo deu um belo sorriso, disse que não e que estava muito confortavelmente sentando NA-QUE-LE lugar. Continuou tentando ler a revista dele. Puto. Realmente muito puto.

Nisso, entrou um grupinho de velhinhos americanos no avião (Primeiro Mundo é assim: hordas de velhinho pelo avião, trem, ponto turístico... Crochê? Joguinho de dama na pracinha? Ficar assistindo televisão em casa? Rá! Velhinho de Primeiro Mundo quer saber de Espanha, Flórida e Caribe!). A filha faz uma cara de nojo e comenta:

Filha: Ai, mãe... Esses velhos vão viajar com a gente? Que nojo... Devem ter tudo cheiro de mijo, que horror...
Mãe: Ai não, eles tão sentando atrás da gente! Não acredito!
Filha: Mãe, vamos ficar até Houston com esse cheiro de velho e mijo atrás da gente?! Vamos reclamar com a comissária?!

Meu amigo decidira que já bastava. Chamou a aeromoça, e educadamente em inglês, comentou que tinha mudado de idéia que achara que era melhor ir para o assento vazio mais a frente.

Filha: Ai, que bom... Finalmente ele se mancou!

Meu amigo levanta, abre o compartimento de bagagem de mão, pega sua bolsa. Olha com a cara mais cínica do mundo para a filha, que se pergunta o que diabos ele olhava nela. E manda:

Meu amigo (em português): Vocês realmente se acham as mais espertas de todas, não é? Claro, porque um americano chato jamais iria falar português. Quanta falta de educação, quanta falta de elegância, quanta demonstração de mesquinharia. Vocês realmente se acham as donas do mundo, não é?

Filha (com vozinha de Patricinha-acuada): Sim, eu me acho sim...

Meu amigo: Pois não o são. Principalmente aqui nos Estados Unidos, queridas – pra nós vocês são assim, ó, desse tamaninho. Não valem absolutamente NADA. Não passam de uma dupla de latinas mal educadas vindas de algum buraco do interior de um país qualquer de Terceiro Mundo, que só porque conseguem pagar uma merdica de passagem internacional , acham que podem agir como se estivessem no quintal da sua casa...

Mãe: Mas...

Meu amigo (interrompendo a mãe): AH, e você, mãe... Cuidado, mas muito cuidado, tá? Hoje você apóia sua filha nesses comentários horríveis que ela fez sobre esses velhinhos aqui. Amanhã, vai ser você deitada numa cama e aí eu quero ver se esse incrível exemplo de educação que você deu para a sua filha na hora em que ela tiver que trocar a sua fralda cheia de merda! Boa viagem para as duas...

Meu amigo se vira a vai para a cadeira dele. A comissária, uma amiga dele, pergunta se estava tudo bem. Meu amigo diz que sim e abre de novo a revista dele. Alguns passageiros, provavelmente de origem hispânica, comentando o que acabaram de ver, enquanto as duas fingem que nada aconteceu.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

It closet


Em idos de 2001, quando eu era apenas um pequeno rapaz campo-grandense (Campo Grande being subúrbio Far-Far-Far Away do Rio, não a capital sul-mato-grossense) do subúrbio do Rio de Janeiro, estudando de um tradicional colégio federal do Rio de Janeiro (meu uniforme era tão 'Baby one more time' feelings :D), provavelmente muito empolgado por estar no meu primeiro relacionamento sério com uma 'pessoa' (adoro quando aquelas caras obviamente gays vão dar entrevistas para Fantástico/Globo Repórter e ficam falando “Mas por que eu gosto de uma 'pessoa'...), provavelmente por estar cansado e triste de repetidamente estar dando balão na minha mãe (“Mas mãe, o pessoal do alemão resolveu marcar um grupo de estudos justamente para sexta-feira às 21h, acredita?!”), provavelmente louco de achar que minha mãe aceitaria 'a verdade' tão facilmente assim, eu resolvi fazer o meu coming-out. Isso mesmo: 16 anos de idade. Enquanto (nessa idade) muitos dos meus amigos gays ainda levavam fé nos seus amassos de matinê com menininhas na Prelude/El Turff, eu já tinha sacado o que eu realmente curtia, já tinha contado tu-di-nho para mamãe (e sofrendo como um condenado por isso – ainda conto a história completa desse acontecimento) e era um leitor costumaz das matérias estilo “10 dicas de como fazer seu homem enlouquecer na cama” das Nova Cosmopolitan e Marie Claire da vida. :D

Talvez por ter feito o coming out tão cedo, talvez por ter pago tão caro e ter que lidar com a frustração potência dois mil de uma mãe paranoica e obsessiva que não media esforços para tentar me colocar no 'caminho certo' (e que provavelmente deveria oferecer treinamento para a CIA e Mossad sobre técnicas de coerção e investigação estilo “O-que-eu-fiz-quando-falei-que-fui-para-tal-lugar”), talvez por ter passado boa parte da adolescência tendo que lidar com o fato de que a minha mãe jamais iria aprovar qualquer coisa de bom que eu fizesse (porque sempre existia a sombra de 'uma certa verdade' que fazia ela dizer que gostaria que eu fosse qualquer um dos rapazes da meu bairro, mas não eu), eu tive que compensar na valorização do fato de que foi bom eu ter sido sincero e ter contado a verdade. Nos piores momentos, onde tudo parecia incrivelmente difícil e eu começava a me culpar por ter sido tão idiota de acreditar que tinha valido a pena ter sido tão sincero tão cedo, eu jogava uma água fria na cara e repetia para mim mesmo que o preço de ter sido verdadeiro era imensurável. Eu não precisaria lidar com essa verdade mais tarde, e logo, quando eu fosse uma pessoa independente e autossuficiente em termos financeiros, minha mãe acabaria entendendo e me aceitando. (P.S.- Ai, esse parágrafo ficou uma coisa tão "Can't take that away"... Foi malz, hein...)

Sendo assim, eu confesso que tenho certo bloqueio de entender porque as outras pessoas não fizeram o mesmo. Entender porque pessoas, já autosuficientes, esclarecidas, seguras do que realmente são, não conseguem se assumir e falar “Eu gosto de moda, eu não uso bermuda cargo, eu sou viado”. Ok: eu entendo que cada um é um universo particular de condições, realidades e histórias, blablabla... Mas confesso que a história de alguns amigos desafia a minha compreensão e exigem certa dose de “sorriso amarelo”+“claro que eu te entendo!”, como a história de dois amigos que eu conto aqui abaixo.

O primeiro é um grande e queridíssimo amigo (que espero que não seja leitor do blog! :D). Advogado, bonito, um dos únicos homens cariocas realmente bem vestidos que eu conheço. Mora atualmente no Leblon, foi criado dentro da Jeunesse Dorée de Niteroí (para quem não é do Rio: Niteroí é um cruzamento de New Jersey com Hamptons, cidade da região metropolitana do Rio poder aquisitivo médio mais alto do que a média da cidade do Rio, mas que por um motivo obscuro... tem uma vida noturna e cultural próxima do zero, o que obriga a maioria da sua galera jovem a ter que partir para o Rio em busca de entretenimento nos finais de semana), atualmente completamente independente em termos financeiros dos pais. Enfim: he is got the looks, the brain, the personality. E apesar de “descoberta tardia”, já tem constando no seu currículo alguns bons relacionamentos de médio prazo, histórias realmente sérias (do tipo namorado fixo, que vai a cinema no final de semana, viaja para destininhos românticos em feriadões, etc&tal). Garotas? Segundo as contas dele, a última ficou para uma noite meio embaçada pela vodca no final de 2009, provavelmente em alguma night “Hetero moderninha”, provavelmente com alguma 'Fag Hag' mais atiradinha e entendiada pela viadice dominada pelo lugar. Mas, mesmo assim... a pessoa ainda se define como... “bi”. E simplesmente não consegue vislumbrar a menor possibilidade de, no médio prazo, se assumir realmente como é para família e amigos, e fica naquele estilo de vida estranho de ser uma coisa no Rio, outra coisa completamente diferente em Niteroí.

Desafio maior à compreensão é o segundo caso. O cara é aquele clássico tipão de intercambista que veio da Alemanha para o Rio de Janeiro, ficou deslumbrado pela beleza da cidade, simpatia das pessoas (oi?!) e abertura em termos sexuais e sociais do carioca médio (hein?!) e criou uma relação especial com a cidade (e para quem eu, escutando ele listar todas as 3053 razões pelas quais ele acha que o Rio é muito melhor do que Berlim, somente sorrio pensando “Deixa ele morar aqui 1 ano para ver como ela vai amar tudo isso” e olho para o meu amigo inglês que está pensando a mesma coisa do que eu). Devido ao seu tipão “Sou-loiro-sou-alto-sou-fortinho-Sou-o-que-Hitler-sonhou-pro-mundo” provavelmente passou o rodo em um número considerável de meninas cariocas (que levam a merecida fama das brasileiras mais jogo-duro, mais “não vou dar assim fácil não!” entre os heteros - mas que abrem as pernas para os gringos, afinal... receber bem o turista é uma obrigação de cada carioca, néam? :D) até o inesperado acontecer: ele topar com um menino brasileiro e ploft!: rolar uma atração inexplicável (o “ploft!” fica à cargo da imaginação fértil de vocês). Curto demais o garoto (mas preciso mesmo bancar o Fernando “bonzinho, coelhinho-na-floresta, amo-o-mundo-só-vejo-o-lado-positivo-das-coisas?” com vocês? Não, néam...), mas preciso confessar que sinto demais aquela coisa de “Clássico caso de 'Porque alemães amam brasileiros'”: do alto dos seus 19 aninhos, morenão com corpão, inteligência definitivamente não é o forte (o que me faz suspeitar de... enormes qualidades não aparentes do ambiente de um restaurante ou sala de estar... :D), recém-saído do armário e com aquela idealização do mundo dos relacionamentos tão típica de quem acabou de sair dos 'teen years', tão típica de quem ainda assiste Bridget Jones e outros clássicos ingleses de comédia romântica e super acredita que dá para transportar isso para fora das telas e viverá uma história igualzinha no mundo gay contemporâneo. Os dois juntos chegam a ser uma coisa “Felícia-in-love”, uma coisa “Labrador-pulando-em-cima-do-dono” de tão Te-amo-te-quero-quero-ficar-todo-o-tempinho juntinho-e-coladinho-em-cima-de-você. Eu fico meio mal perto do garoto, porque sinceramente enxergo nele o inocente-romântico-e-cheio-de-ideais Fernando de alguns anos atrás (mentira: eu sempre fui consideravelmente cínico e cético – esses dias encontrei um dos meus antigos diários de adolescência e fiquei cho-ca-do como eu já era mau: eu metia pau nos meus amiguinhos de classe que me zoavam, nos professores, nos meus familiares e até em alguns dos meus amiguinhos menos próximos! Gente, por que eu sempre fui assim? #Criseinternafeelings) e tenho que me controlar ao máximo para não deixar o meu instinto “WAKE UP, SWEETHEART!” vir à tona e chocar o garoto com o fato de que os filmes para adolescentes da Disney e Malhação não  te preparam para o mundo dos relacionamentos gays no Rio de Janeiro contemporâneo (o máximo do meu autocontrole foi quando estávamos num get together, e ele disse para gente que curtia estar em relacionamentos porque relacionamentos são “um tipo especial de conexão com outra pessoa, essa coisa meio 'um fazendo a barba do outro, juntos de manhã depois de uma noite de amor dormindo juntinhos” - eu respirei fundo, segurei a minha cara de “WTF?” da melhor forma que pude, virei a taça de vinho na minha mão goela abaixo e fui acender um cigarro). Enfim, voltando ao caso inicial: o alemão parece ter se apaixonado de verdade pelo cara, os dois decidiram enfrentar um relacionamento a distância monogâmico, o alemão pega a Lufthansa de volta para o Brasil na primeira oportunidade que encontra pela frente, quando os dois juntos é aquela coisa linda, aquela coisa “Born to make you happy”, etc&tal. Por que diabos estou contando essa história? Por que somente esses dias, quando proferi um discurso “Por que nós, gays...” na frente do Deutscher, eu fui saber ficar com caras é uma coisa meio tipo “Ao Sul do Equador não existe pecado” por parte do alemão: o cara é gay no Brasil e hetero na Alemanha. (!!!) Hein?

A minha capacidade rápida de pré-julgar as pessoas definiria esses dois casos como falta de coragem e culhões. A minha proximidade com eles me faz passar a mão na cabeça, e apesar das minhas pontuais tentativas de tentar mostrar que o mundo “Somewhere Over the Rainbow” tem uma riqueza e uma paz de espírito incomparáveis com o mundo dentro do armário, de tentar compreender os motivos e razões de caras tão... prontos para saírem do armário não o conseguirem fazer.

Mas enfim... o que fazer, néam?