sábado, 3 de março de 2012

Lisboa, Portugal: A viagem, a cidade, o desastre #2

O avião realiza os seus últimos movimentos antes de parar definitivamente na pista do aeroporto de Portela. Os passageiros brasileiros, representando fielmente toda a etiqueta e finesse pela qual somos conhecidos no exterior, se atiram todos ao mesmo tempo aos bagageiros tentando tirar as 174 malas de mão Le Postiche como se o avião estivesse pegando fogo e formam aquela incompreensível fila que não vai andar porque os comissários ainda não abriram a porta do avião. A porta finalmente é aberta, a boiada começa a sair, quando a coisa começa a andar direito decido me levantar e depois que o seu Gérson de Araçatuba percebe que o meu sorriso não significa "Estou adorando ver você pescar as 8 malas de mão da sua família no bagageiro enquanto você impede que eu passe" finalmente saio do avião. O choque de temperatura que sempre acontece nas viagens em que você muda de hemisfério. Caralho, 7°C eram bem mais agradáveis na minha memória! E voilá, os primeiros passos em continente europeu itself.

Enquanto caminhava para a imigração, olhava ao redor e tentava comparar com a minha chegada em Frankfurt, primeira vez ever no exterior. Definitivamente a coisa perde a magia e o impacto depois da primeira vez. Agora eu estava bem agasalhado, seguindo tranquilamente meu caminho para a saída sem sobressaltos, em um aeroporto europeu razoavelmente bem sinalizado e organizado. (Tem uma coisa boa de ter a Infraero como administradora de aeroportos - a gente fica sempre preparado para o worst scenario case. Tenho sérias dúvida que o aeroporto de Jalalabad deva ser tão pior assim do que a pista de pouso que nomearam de "aeroporto" de Vitória...) Passei tranquilamente pela imigração, já que vinha para a Europa com um visto de longa duração para a França. No balcão do meu lado, um passageiro ainda de camisa de time de futebol, calça moletom e chinelos argumentava com o oficial português "Mas eu sou estudante de Direito da Universidade Federal da Paraíba, meu senhô!". O oficial português devolve o meu passaporte, revirando os olhos para a cena que se passa ao lado. Eu penso em como uma pessoa razoavelmente inteligente não consegue entender algo tão claro: você está viajando para o outro lado do mundo, você está viajando para um país que já nos colonizou (portanto com o qual sempre haverá algum tipo da herança do dominador x dominado - isso não acontece somente conosco, já vi acontecer com americanos na Inglaterra, mexicanos na Espanha e o mesmo com os habitantes dos territórios ultramarinos na França metropolitana), europeu é um povo chato que adorava analisar o outro pela forma de se vestir e você vai depende de um deles para entrar ou não entrar no continente. Custa meter um Converse, uma calça Jeans e uma camiseta branca e tentar ser educado sem dar carteirada?

Lisboa parecia Londres. 7°C, com uma neblina tão espessa como aquelas que costumam dar K.O. em Congonhas e Santos Dumont simultaneamente. Africanos, muitos africanos esperando na saída do desembarque internacional. Tudo exatamente igual, como da ultima vez que tinha vindo de Hamburgo. O aeroporto da Portela é pequeno em relação aos outros aeroportos de capitais europeias, as áreas comuns são mais compactas e a arquitetura interna lembra um centro comercial dos anos 90. E, apesar do considerável volume de passageiros, bastante confortável e visivelmente bem administrado. Achei facilmente o guarda-volumes, onde deixei a minha mala de mão por 3€ ou 4€ e peguei uma bolsa-carteiro, e parti para o ponto do Aerobus para ir para o centro de Lisboa.
Sentado em um autocarro que eu já conhecia. (Nunca me canso: por que o Rio de Janeiro não consegue seguir a bosta do exemplo, acabar com a concessão daquela bosta da Real Bus e montar um sistema minimamente funcional ligando os dois aeroportos à cidade?! 1,75€/R$2,30, regularidade de 10-15 minutos, ônibus normal com um bagageiro na frente. Simples assim. E melhor nem falar de Sao Paulo, porque ainda não consigo conter a gargalhada quando penso no Airport Bus Service cobrando R$33 para ligar Guarulhos à São Paulo.) Em uma cidade que eu já conhecia. Sem nenhum tipo de compromisso marcado. Olhando pela janela do ônibus e vendo os subúrbios de Lisboa passarem, as avenidas ligeiramente congestionadas durante o horário de rush matinal. Os azulejos e decorações dos prédios e casas de arquitetura portuguesa mais tradicional se alternando com as linhas retas, grandes espaços e concreto armado dos prédios de arquitetura moderna (International Style, Brutalismo, alguma coisa de Art Déco) que predominam fora do centro histórico de Lisboa. Engraçado como enquanto construimos Brasilia para tentar fugir da herança europeia carioca deixada por eles, eles faziam exatamente o mesmo nos seus subúrbios e colônias, e o resultado é algum tipo de sincronia entre os dois. Muitos prédios históricos que a crise condenou a algumas décadas à mais de negligência e descuido, mas que os criativos lisboetas decidiram intervir de alguma forma. A foto acima representa muito do que eu amo em Lisboa: uma decadência do clássico e do histórico, um não-conformismo e irreverência para a expressar a modernidade e criatividade inerente de uma cidade. 
Primeira parada em Lisboa obviamente tinha que ser na Praça do Comércio. Primeiro, porque justamente durante a minha primeira vez em Lisboa ela estava em reformas e eu mal consegui ver a estatua do D. José I por cima dos tapumes da obra. Segundo, porque a Praça do Comércio é aquele tipo de lugar que concentra a essência de uma cidade. O tom de amarelo tipicamente lisboeta dos edifícios ao redor da Praça. O arco triunfal da Rua Augusta, de onde se espreita o movimento elegante das pessoas pela rua mais importante do Centro. As longas arcadas, com as repartições publicas e os sapatos dos portugueses elegantes ecoando enquanto eles seguem apressados para algum outro destino. E o Cais das Colunas... O Cais das Colunas, com as suaves ondas do Tejo batendo contra as escadas, o vento com cheiro de sal, a sensação que o Atlântico não se encontra muito longe, as gaivotas, a vista deslumbrante para a Ponte 25 de Abril. Um lugar de onde fica fácil compreender a relação de reverência e amor dos lisboetas com relação ao Tejo, o rio que leva ao mar, que leva ao mundo, ao ultramar. Onde eu acho que todo brasileiro que se entenda como de origem portuguesa tem um arrepio ao perceber sua origem, sua ligação tão próxima com algo tão antigo, tão belo, tão majestoso.
Passeio pelas calçadas ainda vazias do Centro de Lisboa, um expresso em um dos inúmeros cafés da Rua Augusta. (Inesperadamente acompanhado de um Marlboro Light! Portugal deve ser um dos últimos países da Europa que ainda permitem restaurantes com áreas para "fumadores e não-fumadores" e pareceu uma viagem no tempo poder fumar sentado, num espaço fechado, tomando um café enquanto outras pessoas faziam o mesmo ao meu redor...) Com somente algumas horas em Lisboa, o que seria impossível não fazer? Um passeio ao esmo no Eléctrico 28. Da Baixa de Lisboa até Martim Moniz, passando pela Alfama. O histórico do histórico, o turístico do turístico passando pela sua janela. Sé de Lisboa, Castelo de São Jorge, os miradouros fantásticos dando para os telhados e para o Tejo, as ruelas da Alfama, o Palácio de São Bento. Tudo isso com você circundado por hordas e mais hordas de lisboetas, ainda maioria na linha que é essencial para os moradores desses bairros, quase todos idosos com pacotes e mais pacotes, equilibrando-se em bengalas, enfiados em seus sobretudos para aquecerem-se do inverno português. (Idosos, idosos, idosos... A impressão é que Lisboa é toda ocupada por idosos. Não sei se lá eles saem mais ou se Portugal é mesmo um pais tão idoso como os números dizem. Todos com aquele irresistível ar fofo de vovô/vovó que a gente deixou no Brasil...) Pelas janelas, Lisboa passando. Alguns poucos sinais da crise. Cartazes de partidos políticos conclamando à Rejeição do Pacto de Agressão, como alguns nomeiam o pacote de medidas da União Europeia, organismos internacionais e do Governo Português para sanar a economia. Pichações xingando os políticos e anunciando o inicio de um novo período de trevas e regresso econômico para Portugal. Excesso de pessimismo tipicamente europeu ou experiência da antiga metrópole de um império global que teve que se acostumar com o provincianismo? Difícil saber agora.
Desci do Eléctrico em um ponto absolutamente desconhecido (Ah, as emoções e perrengues de viajar!).  Peguei algumas informações dos invariavelmente simpáticos e atraentes, se você conseguir superar o fato de que eles batem no seu ombro policiais e desci para as imediações da Avenida 24 de Julho. Na hora de escolher a direção do eléctrico, oh duvida cruel! Para um lado, eu poderia voltar para o Centro de Lisboa e subir nos malditos elevadores que eu nem sequer tinha visto na primeira vez. Por outro, as docas de Alcântara e Belém. Claro que Belém. Mosteiro dos Jerônimos, Padrão dos Descobrimentos e Torre de Belém? Não. Belém e a Antiga Pastelaria de Belém. Ah, como eu esperei por esse momento! Descer do elétrico, atravessar a rua, passar pelas lojas de souvenires e restaurantes. Avistar os azulejos, o toldo azul da fachada. (E descobrir que alguma mente imbecil decidiu abrir um Starbucks dois números depois. O que merece o monstro português que, tendo acesso aos cafés, chás e os pastéis de nata quentinhos e fresquinhos da Antiga Pastelaria... decide voluntariamente ir a um Starbucks?! Começaria com 5 horas de um playlist composto unicamente de "Ai se eu te pego" no modo Repeat All/Repeat Always, só para louvar a herança lusófona deixada na antiga colônia da América do Sul.) Entrar na fila, pagar míseros euros, ver os atendentes polvilharem canela e açúcar nos pastéis quentinhos e os enfiarem na linda embalagem azul e branca de papelão. Escolher algum banco ao sol em frente ao Mosteiro dos Jerônimos, sentar e devorar os 4 pastéis como se fosse a primeira vez, vendo a vida em Lisboa seguir o seu curso. Lembrar dos dois anos que você sentiu tanta falta desse sabor, entrar em pânico, decidir voltar e comprar mais dois pastéis. Sentar de novo no mesmo banco e se sentir a pessoa mais gulosa do mundo, imaginando a quantidade colossal de açúcar e gemas de ovos que você acabou de consumir. Se sentir a pessoa mais gulosa do mundo, e rir de felicidade por ter origem portuguesa e culturalmente poder aproveitar sem culpa alguma toda essa felicidade que somente esse excesso de açúcar pode provocar.
Em Belém, encontrei com o B., que tinha me hospedado na sua casa na minha primeira vez em Lisboa. Fomos ao seu apartamento no calmo bairro do Restelo, almoçamos, conversamos sobre a vida, aproveitei para entender como os portugueses estavam reagindo à crise. (Ele também é economista.) "Os portugueses chegaram à conclusão que o pais simplesmente não é viável economicamente. Portugal jamais seguirá para frente.", disse ele. Ui! Pensei nostalgicamente na Lisboa da Alfama, dos bares do Bairro Alto, da Lux, dos restaurantes e prédios fantásticos de Alcântara, dos restaurantes e prédios fantásticos da Expo de 98 e me perguntei como estaria tudo da próxima vez que eu viesse a Portugal. Se teria eu visto Lisboa em um isolado momento historico de euforia e otimismo que teria servido de preambulo para um doloroso processo de decadência econômica. Enfim...

Uma passada na loja do Nespresso do El Corte Inglés para o B. pegar sua encomenda de capsulas. (Os elegantes portugueses saboreando expressos, lindos vendedores de meio metro de altura enfiados em ternos seguindo de um lado para o outro servindo xícaras e entregando capsulas, um sol de final de tarde de inverno entrando pela loja. Tão bizarro, uma cena tão europeia se passando na minha frente... em português.) E o B. me leva ao aeroporto de Lisboa, mais uma vez, onde nos despedimos até à proxima vez.

Duas horas para o horário de embarque, retiro a mala do guarda-volumes, faço o checkin e passo na revistaria. Compro alguns postais e na hora de pagar olho para a prateleira de livros. Bate uma puta nostalgia. Percebi que aquela seria a ultima vez, em seguramente muito tempo, na qual eu poderia ter o prazer de escolher um livro, ao meu gosto, para ler no meu idioma materno. Agarro a edição portuguesa de "A Primeira Aldeia Global: Como Portugal mudou o mundo" de Martin Page e "S.O.S. Angola", relatos e depoimentos da fuga dos portugueses e imensa ponte aérea organizada para evacuar todos os colonizadores às vésperas da independência de Angola, reunidos pela jornalista Rita Garcia. (Dois comentarios. #1: 200 mil portugueses se amontoando no aeroporto de Luanda para conseguirem embarcar em qualquer coisa, Portugal tendo que organizar a maior evacuação aérea da história, até os EUA enviaram aviões da American Airlines para ajudar e os FDP dos suíços cobram pelo uso da Swissair e deixam os portugueses passando fome de Luanda até Angola. Que eles eram o povo mais chato do mundo eu já sabia, mas mesquinho? FDP's! #2: Incrível que comentemos tao pouco sobre esse tema no Brasil. Em Portugal, contei 12 livros sobre o tema somente nas poucas prateleiras da revistaria.)  Sento numa cadeira para escrever um cartão-postal para a vovó, o cansaço de uma noite mal-dormida, 3 horas de jet-lag, mudança de temperatura e o drama de estar 24 horas sem um banho começam a bater, coloco o cartão no correio e checo o relógio. Uma hora para o embarque no portão. Já que estamos em Portugal, bate a segunda nostalgia do dia e penso "Poxa, tão chato ir embora daqui... Gosto tanto de Tugal!". Supero a nostalgia pensando no meu namorado me esperando em Paris e na Boulevard Haussmann, Printemps, H&M da Champs, H&M da Haussmann, H&M do Les Halles. "Melhor ir agora... Caso sobre tempo, posso ficar olhando aquele bando de coisa cara nos duty free que nunca compro mesmo...", pensei. Inocentemente.

A maior fila para passar pela segurança em aeroporto que eu já vi na minha vida. Juro. Três raios-X para uma fila que tinha fácil umas 300 pessoas. Gelei. Mas pensei "Ah, deve andar rápido... Não é possível que eu vá ficar 45 minutos nessa fila!" e resolvi esperar na fila. 45 minutos para o embarque e eu devia ter andando 2cm. Os oficiais portugueses tocando o terror nas bagagens de mão da galera. ("Como assim vou ter que jogar fora meu Victoria's Secret?! Ju, te falei pra enfiar essa merda na mala, CARALHO!" ressoou pelo longa sala da checagem de segurança.) A porra da fila simplesmente não andava. Olhei para o relógio, 35 minutos para o embarque. Comecei a entrar em pânico. Olhei para o lado e vi uma fila separada que dava direto numa funcionária da TAP segurando um comunicador. Peguei a fila especial e educadamente falei para a funcionária que precisava embarcar no voo para Paris que ja estava sendo anunciado. "Nao é possível passar à frente no controlo de segurança. Ainda há tempo mais do que suficiente, podes esperar na fila." falou a portuguesa FDP bigoduda do caralho. Olhei para o relógio, olhei para ela com cara de "Será?", pensei que ela deveria saber mais do que eu, voltei para o meu lugar na fila e continuei esperando. 30 minutos para o embarque. 25 minutos para o embarque. A fila não andava. Simplesmente não andava. Começam a chamar os passageiros do voo no alto falante. Começo a chorar dentro da minha cabeça "Eu queeeero ir pro norte da Eurooopaaaaa! Me deeeeixa passaaar!". 20 minutos para o embarque. E vejo uns passageiros gringos tão em pânico quanto eu indo falar com a funcionária, que vira e responde falando em inglês que eles vão ter que pedir para passar na frente de algum passageiro. (E obvio que o passageiro aleatório deixa, porque dizer um não nessa hora provavelmente equivale à reencarnar como mulher muito gostosa, com a libido sexual da Valesca Popozuda. Na Arabia Saudita.) Lembrei das minhas origens e pensei "Qualé a dessa vacilona bigoduda aê, mermao? Deixando a galera passar a fila para entrar aê no baile, e eu aqui no maior vácuo? Ta de zoação com a minha cara? Vambora resolver essa parada aê!". Cheguei chegando e já mandei um "Olá, preciso passar AGORA!" para a bonitinha, que me devolveu que tinha que pedir para passar na frente de algum passageiro. Suspirei lembrando dessa maldita mania europeia de fazer você se sentir culpado por não ter chegado 749 horas mais cedo e querer te dar lição de moral justamente no momento que você não tem tempo para uma lição de moral caralho!. Cacei o primeiro passageiro com passaporte azul, fiz a cara mais Chat Potté possivel, entrei na fila, tirei cinto, tirei sobretudo, passei pela segurança opa, oficial de segurança gato!, coloquei cinto, coloquei sobretudo e lá foi Fernando correr como um louco pelo aeroporto da Portela. Um homem, um destino, uma meta. 

(Será que Fernando conseguiu pegar o avião? Será que ele se lembrou de fechar o cinto e quase-nao ficar pelado no setor de salas de embarque do aeroporto de Lisboa? Será que a funcionária portuguesa da TAP irá conseguir encontrar uma solução para o hirsutismo que tanto a aflige? Mais, em um proximo post. :P)

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Parênteses


Eu estou chato. Ou pior do que isso, eu me deixei ficar chato. Perdi a empolgação de escrever para o blog. Por que? Passei a me preocupar demais com a forma da mensagem que eu queria passar. Se as pessoas entenderiam mesmo o que eu queria falar ou se ficaria soando “pedante”. Internalizei parte dos comentários mais idiotas deixados por trolls nesse e em outros sites que comento frequentemente. (E que, quase sempre, respondia repetindo na minha cabeça “Stop being a bitch/Stop being a bitch/Try to be nice” enquanto revirava os olhos.) Comecei a me policiar, estudando cada frase escrita de cada post, retirando uma ou outra citação mais polêmica/irônica que pudesse ser mal interpretada. E com isso deixei de escrever para o leitor que curtia os meus posts, as minhas pirações “on the road” e comecei a escrever pensando no leitor que jamais vai entender o conceito de “interpretação de texto” + “ironia”.

Por que?!

Foi exatamente o que eu pensei hoje. Eu não sou jornalista, portanto não preciso nem de longe me preocupar em montar um blog bem comportado. Agora estou na França, portanto a possibilidade desse blog complicar a minha vida com um potencial empregador é tão grande como a possibilidade de eu chorar porque “eu morro de saudades de tudo no Brasil”. (Saudades dos amigos? Sempre. Saudades do calor absurdo de Bangu em Janeiro/Preços absurdos para tudo-e-qualquer-coisa/Gente creyça achando que tênis de academia de R$400 foi feito para sair para ir para a night e tendo a ousadia de criticar o meu outfit? Nunca + “Monsieur, desce uma taça desse Riesling de 4€ que eu acabei de lembrar que tomei muito Liebfraumilch quente nessa vida!”) E finalmente, sempre fui um dos maiores defensores do “Te acho legal, mas isso não signfica que não vou dizer que achei o seu comentário/post uma merda”! Por que iria deixar esse autopoliciamento me fazer perder a motivação de registrar esse momento tão importante da minha vida? Eu estou em fucking Paris, putain! Parisienses são cínicos e arrogantes; eu amo/sou cínico e arrogante. :D Tem milhões de coisas que me fazem pensar “Isso daria um post irado!”. Por que eu não estou fazendo isso?

Enfin. The bitch is back.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Lisboa, Portugal: A viagem, a cidade, o desastre #1

Portugal é um país que exerce um tipo de atração inexplicável em mim. Inexplicável porque na eu sempre fui o tipo clássico de paga-pau gringo: quanto mais exótico, melhor. Aprendi alemão durante 7 anos, fiz dois semestres de japones (sendo que tudo o que eu consegui reter até hoje foram duas ou três frases idiotas que servem perfeitamente para o que eu queria: fazer os japas darem pulinhos de "Ooown, ele fala o meu idioma!" e ganhar a amizade deles) e até russo entra nessa lista. Enquanto isso, todas as línguas latinas foram sumariamente ignoradas por serem "muito próximas do português". (Primeiro, vamos combinar que estímulo para estudar espanhol não rola: pagar caro para se enfiar uma vez por semana para ficar numa sala por duas horas aprendendo "Ay Ay Ay / Mi cuerpo / Baila / Caliente!" não é comigo; italiano eu até acho incrivelmente lindo e sofisticado mas... em termos de importância profissional eu tenho impressão que tá ali, ombrinho à ombrinho, com holandês ou sueco; e francês eu sempre achei que não precisaria muito além do que eu já sabia...  Eu sei, destino fazendo um "Há Há Se Fudeu!".)  Por isso, Portugal foi uma surpresa tão inesperada da primeira vez - tinha ganho a passagem de presente de aniversário durante o meu ano na Alemanha, e super me questionava (antes de ir) se não deveria mudar o destino para um lugar mais exótico, tipo Turquia ou Países Bálticos. Que sorte foi não ter mudado, pois foi exatamente o que eu precisava naquela época: um contato com tudo o que eu sentia falta do Brasil (idioma, cultura, o jeito descontraído das pessoas) e o que eu começava a perceber tinha me identificado na Europa (o estilo de vida, o papo das pessoas e o jeito de se vestir mais aberto e moderno). E por isso, dessa vez, quando tive que escolher entre Ibéria (nem que me oferecessem um Piquetón + um nacão de Presunto Pata Negra!: pagar para viajar numa banheira voadora com comissárias espanholas dando fora naquele sotaque irritante, risco real de passar perrengue em Barajas e justamente na rota HookersSource-HookersParadise, digo... Rio de Janeiro-Madrid? Acho que não...), Alitalia (Amo Roma, acho uma das cidades mais fantásticas e incríveis que eu já visitei na vida, ainda tenho listas e mais listas de coisas para ver naquela cidade... mas o fato de que iria passar somente 12 horas na cidade em que faria a escala para Paris + a lembrança da baguncinha gostosa que é Ciampino+Fiumincino deram medinho e preferi play safe...) e TAP, acabei pegando a última. Doze horas em Lisboa para cobrir o que eu não tinha conseguido ver na viagem anterior e me adaptar lentamente à realidade de que eu estaria mudando para a Europa - o que mais eu poderia querer da vida?! :D
O voo foi aquela coisa completamente normal. Sendo bem sincero (vai soar meio "Oh-sou-foda, tenho milhas para ir até Saturno e voltar na Executiva!", não tenho, mas foda-se...), eu compartilho daquela ideia de que depois de algumas viagens você meio que abandona aqueles pensamentos maniqueístas tipo Companhia-A-é-MARAVILHOSA!/Companhia-B-é-uma-MERDA! e que percebe que a Air France não é o supra-sumo da sofisticação francesa, a TAM não é a vergonha cafona-caipira brasileira que todos achamos (apesar de ainda arduamente esperar que eles abandonem aquela ideia cafona de vestimenta caipira em Junho/Julho - gente, hora de superar Marília, néam?!) e que no fundo todo voo depende de uma união de fatores que envolve equipe, passageiros, tempos e posição dos astros no Universo. (Provavelmente a exceção devem ser aquelas companhias absurdettes do Oriente Médio e Sudeste Asiático onde as comissárias de bordo tem cara de colegial japonesa com educação de gueixa/servem cordeiro-assado-com-tâmaras-colhidas-no-Vale-do-Swat-durante-a-única-chuva-do-ano... mas com toda uma reserva gigantesca de petróleo debaixo do seu rabinho para torrar e nenhuma pressão política para racionalizar seus gastos fica fácil meter dinheiro sem fim numa companhia aérea nacional, néam?) A TAP foi bem aceitável: comida normal (ou seja, aquele frango-com-massa ou carne-com-legumes que tem gosto de plástico assado com chuchu e que você decide deixar pela metade mesmo para se empaturrar com o pãozinho invariavelmente frio e o plástico EVA que eles insistem em chamar de "pudim".), nenhum grande sorriso/nenhuma grande grosseria das comissárias, sistema de entretenimento normal (um monte de filme que você acaba não assistindo direito porque fica no eterno dilema "Tento-dormir-ou-chego-monstro-mesmo?") e um monte de brasileiro pirando no casacão Vou-explorar-o-Ártico indo passar as férias de verão no hemisfério norte. 
Ao final das 9 horas que separam o Rio de Lisboa (um tempo de viagem bem ideal, sabia? Acima disso é sempre aquela coisa "O café-da-manhã-é-servido", você está descabelado num nível Medusa-in-a-bad-hair-day por ter conseguido só dormir umas 2 horas, olha pro relógio e vê que ainda faltam 4 longas horas para chegar ao destino final...), o comandante anuncia que estamos chegando perto de Portugal e o pequeno-almoço começa a ser servido. Eu olho pela janela e vejo a escuridão cobrindo alguma parte do Saara Ocidental/Marrocos e finalmente cai a ficha de que eu estou indo para o outro lado do mundo. Uau. Como esse sentimento me assusta e excita. E como eu queria que eu tivesse algum dos meus amigos que tinha deixado no Rio para cutucar naquela hora, acordá-lo e filosofar sobre isso, nem que fosse me esperando no aeroporto em Lisboa. Enfim, viajar sozinho é uma chatice inevitável e continuo olhando a janela. E as luzes de Lisboa começam a aparecer, com o sol começando a nascer no horizonte. Fantástico. O aeroporto de Lisboa fica numa posição que os voos que irão pousar acabam fazendo um city-tour inevitável sobre a cidade, e acabo vendo a Ponte 25 de Abril, as docas de Alcântara, as Setes Colinas de Lisboa. Começo a tentar substituir a tristeza de ir para longe dos meus amigos pela excitação de pisar em um lugar estrangeiro. ;)

(To be continued)

Onde?: 62 Rue des Martyrs, 75009 Paris
Por que?: Porque tem Internet sem limites e grátis, o ambiente é de um café moderno, descontraído, meio escandinavo na decoração mas ultra parisiense na frequência e o barista é um daqueles tipo de bofe escândalo magro, alto, bem vestido e com cara de inteligente-e-esnobe-mas simpático que só Paris sabe produzir ainda tem vista de cara para o Sacré-Coeur de qualquer lugar onde se sente no café. Ah, e os cafés são ótimos.
Preço: Naquela categoria "Tiro o escorpião da carteira porque vale a pena". (Até barato, considerando-se a piração de preço nos cafés de Paris...)

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Só uma pausa

Muito bem produzido, inquestionável. O que são esses homens, mon dieu! (Apesar de quando eu vejo modelos sempre bate um questionamento "Será que ele é um daqueles que fica encolhendo a barriguinha - inexistente - por 30min na frente do espelho?" ou que diz com um ar acusador "Você vai comer mesmo isso? Se mim fosse você, eu não faria isso..." quando você pega um Cornetto Ultra Plus Fat e ele um Molico de Pêssego Xoxo.)

Mas... Made in Brazil? In Brazil? Really? Tem certeza que não é Made in Sweden ou Made in Italy não? Nej?

Ok, super sei que modelos não são representações fiéis da realidade (afinal, 99,999% da população mundial ou tem o look ou tem o brains), mas engraçado que esse vídeo veio de encontro com um pensamento que surgiu ontem quando eu fazia um rápido passeio na Galeries Laffayettes. Passeando pelas elegantes (algumas nem tão caras assim, sabia?!) seções, eu parei na elegante seção da Dior Hommes e vi algo que me fez parar. Um elegante vendedor vestindo um terno absolutamente fantástico para o corpo dele, como todos ali, mas algo me fez parar o olhar naquele vendedor em especial. Sabe quando algo chama a sua atenção? Logo eu entendi: o vendedor era negro. E a pele dele reluzia aquela incrível luz que a pele negra emite quando está bem hidratada. (Tipo P.Diddy, saca?)  E continuando o passeio pela minha loja, mais e mais vendedores negros e mestiços. E eu me peguei pensando porque eu tinha parado meu olhar naquele vendedor em especial. 

Provavelmente por que nós, brasileiros, rejeitamos a associação de negros com sofisticação? Soa um pouco pesado, não? Eu já tinha dado uma divagada sobre o assunto aqui. Enfim...

Rio de Janeiro


Engraçado como a sua perspectiva acaba mudando quando você sabe que são seus últimos momentos em um lugar. Tudo aquilo que era parte de uma irritante rotina acaba tomando uma cara de “Ah, é a última vez que eu...” (sim, eu continuo o mesmo dramático de sempre). Tudo o que faz a vida em uma determinada cidade completamente ordinária depois de um tempo que você mora nela começa a te provocar um sentimento de nostalgia antecipado.

Todo mundo que acompanha o blog há algum tempo meio que sabe: em 2009-10 eu tive o meu ano de intercâmbio na Alemanha. Ah, que incrível ano! Tantas coisas vividas, tantas novas experiências, tantos homem gato que eu pegu... tantos museus incríveis que eu conheci! :D
E que inferno foi voltar ao Brasil. Eu lembro como se fosse exatamente agora: meu voo era Zurique-São Paulo. Eu fui o último a sair do avião da Swiss, com o espírito mais “Neeeeeeeeeeeein, lass mir bleiben!” possível. Disse o meu último “Auf Wiedersehen” para a comissária com o sorriso sou-um­-brasileiro-simpático-e-sorrio-sem-motivos-mas-sei-que-você-acha-meu-sotaque-fofinho e, cabisbaixo, saí do avião. Meras 13 horas antes fazia 2°C em Zurique. Fazia 32°C naquela hora em Guarulhos. Eu olhava para aquela decoração bosta da Infraero e pensava “Não pode ser: eu estou de volta!”. (Parênteses: Por que a fixação do pessoal da Infraero que define os projetos de decoração dos aeroportos com vidro fumê, aço escovado e granito, hein? Caralho, os aeroportos brasileiros tem o mesmo clima amistoso e receptivo de um consultório de dentista da década de 80.) Saí do setor internacional e levei o baque duplo do calor (mesmo com o “ar condicionado” de Guarulhos – sim, eu fui irônico porque acho que o “ar condicionado” de Guarulhos sempre está desligado quando eu estou por lá.) e das pessoas ao meu redor falando português brasileiro. Entrei na fila de embarque da TAM para pegar o meu voo para o Rio, uma criancinha em direção ao Nordeste olhou para o meu bronzeado hamburguês e tocou no meu sobretudo de lã pesada com a cara mais “WTF is that?” possível. Vinha com um sobrepeso absurdo de viagem internacional, mas para o meu choque a funcionária da TAM mandou um “Relaxa, coloca tudo aí, o voo tá vazio...” e eu viajei com mais do que o dobro do limite de bagagem para um voo da Ponte Aérea sem pagar um centavo a mais. Quase dei uma sambadinha para agradecer.

De quando eu vi o Rio pela primeira vez, eu também lembro. Tinha uma argentina sentada do meu lado, indo conhecer a cidade pela primeira vez. Troquei uma ideia com ela sobre os locais que achava que ela deveria conhecer, as dicas para fugir dos golpes cariocas com turistas. E me virei pro lado e vi a Restinga da Marambaia aparecendo pela janela. Liguei o iPod no “Samba do Avião” (ainda não consigo decidir se é um clássico ou uma cafonalha escutar isso quando se volta ao Rio, mas acabo sempre o fazendo), apoiei a cabeça na janela e fui tentando adivinhar quais partes da cidade que eu via. Toda volta de viagem sempre provoca uma nostalgia (na verdade uma PUTA deprê, néam?) mas voltar pro Rio sempre tem algo de especial. É meio que um consolo olhar para Ipanema, para as montanhas, para os prédios históricos do Centro. Meio que um carinho na sua cabeça falando “Darling, tem gente que volta para Detroit! Olha para que lugar incrível você está voltando!”.

Escrevi tudo isso para dizer como é surreal estar deixando o Rio de Janeiro, em definitivo. Os motivos? Sinceramente falando? Estou indo morar com o meu namorado francês em Paris. Simples e direto assim. Para os outros, eu confesso que sempre floreava com um “Mas também estou com um projeto mega definido de fazer mestrado em Estratégias Matemáticas Avançadas!”. Na verdade foi um projeto puramente passional mesmo. Ok, não sai correndo de uma hora pra outra, larguei tudo e gritei para o meu namorado por telefone “Meet you in Paris!”. Planejamos isso por quase 2 anos – dois longos anos em que nos víamos sempre que dava um tempo na agenda. E como bom virginiano, me assegurei de todas as formas possíveis do que poderia dar errado. E claro que coisas que eu esperava que não fossem dar errado deram errado. Mas enfim, assunto para outro post.

O foco aqui é mesmo o Rio de Janeiro. A estranheza que me causa quando eu olho para essa palavra e penso que ela não mais significará “casa” para mim. A ironia de quando eu penso em como eu odiei essa cidade quando voltei da Alemanha em cada uma das suas características – falta de pontualidade, falta de compromisso, falta de organização, calor infernal, provincianismo. E como nesses últimos dias eu sabia que cada uma dessas coisas iria me fazer falta. De como voltar da Alemanha foi essencial para que eu reavaliasse muito do que o Rio de Janeiro era, do muito do que eu tinha do Rio de Janeiro e de que eu finalmente compreendesse que não existem lugares perfeitos no mundo - só alguns que combinam mais com os seus valores e desejos. Como eu fiquei puto em voltar ao Rio de Janeiro daquela vez! E como hoje eu entendo perfeitamente que eu TINHA que passar por esse processo de readaptação que me fez seguramente ficar muito mais forte e maduro. E que me fez me reconectar com uma cidade que eu sabia que não seria a minha cidade para todo o sempre, mas que tinha definido a minha personalidade. Algumas vezes precisamos ir ao outro lado do mundo para entender o que está bem ali, na nossa frente.

Saudades do Rio de Janeiro. Eis a sina de todo carioca que escolhe sair dessa cidade em algum ponto da sua vida. :)

P.S.- Sobre os amigos... melhor nem começar a falar. Principalmente porque eu já passei um RevitaLift no rosto, o avião já começou a descida para Lisboa e as comissárias portuguesas tem cara que tiram o buço na pinça de tão macho que são, portanto nem rola chorar para depois ter que reaplicar o produto. Mas te falo: doí. Pra caralho.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

We will forget


Não sei bem o porquê, mas quando comecei a escrever essa primeira frase dessa postagem, lembrei do Hobsbawm falando  no 'Era dos Extremos' sobre como ele a tinha a exata lembrança de voltar da escola na Berlim dos anos 30 e ler nos jornais que Hitler havia sido nomeado chanceler. Eu lembro exatamente daquela manhã de 11 de Setembro de 2001. Eu estava doente, com uma irritante faringite, o Pedro II estava de greve (para variar) e tinha dormido muito mal. Minha mãe veio me dar remédio e falou com a maior naturalidade "Parece que os Estados Unidos estão sendo atacados.". Eu ri, falei que ela estava delirando e liguei a TV. E ficamos os dois completamente perplexos assistindo àquilo tudo. Horas e horas. Mais tarde acabei melhorando e fui para o meu curso de alemão, lá no Centro. Inútil. O clima no Instituto Cultural Brasil-Alemanha foi o mais soturno possível, a minha professora de alemão começou a falar sobre como aquilo tudo que tinha acontecido lembrava ela dos bombardeios aliados à cidade dela, Augsburg.

10 anos depois, lendo sobre os eventos de lembrança da fatídica data, vendo as reportagens no Fantástico (incrivelmente superficiais, incrivelmente óbvias - o quão chato é ouvir aquela voz da Patrícia Poeta de professora-de-biologia-boazinha-dando-uma-notícia-triste-mas-com-uma-mensagem-feliz-no-final) engraçado perceber que o tempo passa, as lembranças ficam mas os discursos acabam mudando. Bush hoje em dia é um mero coadjuvante, o discurso oficial do presidente é bem menos "O-estilo-de-vida-democrático-e-livre-da-América-foi-atacado/Let's NUKE them!", Obama encarna o discurso inspirador chatinho de presidente americano mas em um tom bem mais light e Bloomberg é seguramente bem menos carismático de que Giuliani (afinal somente um imbecil proporia cortar a leitura dos nomes das vítimas nas próximas cerimônias - aquela encheção de saco de um monte de adolescente americano dentuço mal vestido cantando aquele hino irritante pode ter, mas o único momento em que cada um dos mortos é relembrado... ah, pode esquecer?!). O Afeganistão foi devidamente introduzido à sociedade moderna (afinal, quem precisa de hospital quando se tem Subway?); o Iraque é praticamente um resort babilônico em termos de tranquilidade e liberdade e o Paquistão continua sendo o mesmo lugar complicado de sempre.

Ironias a parte, acompanhando a reação de alguns amigos (americanos e não americanos), não pude deixar de pensar em uma coisa. Em como nos preocupamos com o que aconteceu em Nova York naquela manhã de Setembro de 2001. Triste foi, triste sempre será ver imagens como a clássica "The Falling Man" e não pensar por ao menos um segundo no pânico em que 2.606 pessoas viveram, algumas delas ao perceberem que não conseguiriam sair do prédio, algumas delas ligando para seus parentes e dizendo a última coisa que elas sabiam que iriam dizer, algumas delas tendo que fazer a cruel escolha entre a morte por asfixiamento ou a a queda livre em direção ao fim. Mas ainda assim... como nós nos preocupamos com o que aconteceu ali, naquela manhã de Setembro de 2011, nos emocionamos com os documentários e reportagem sobre o tema. E nem sequer nos lembramos do que aconteceu no dia 11 de Julho de 1995, quando cerca de 8 mil homens e meninos deram adeus para suas mães e irmãs e foram levados pelos sérvios, sob o complacente olhar das forças holandesas para Srebrenica. Ou fazíamos, o que a imprensa internacional divulgava (os preparativos para a Copa do Mundo, talvez?) nos primeiros dias de Abril de 1994 enquanto o Tenente-General Roméo Dallaire tentava convencer algum burocrata de Nova York que a crise em Ruanda era séria e que desencadearia na morte de somente 800.000 mil pessoas.

Impossível chamar uma morte pior do que a outra - afinal, para algum parente, irmão, primo daquela pessoa, aquele evento foi a fonte da pior dor que pode existir. Mas me incomoda, enquanto cidadão brasileiro, ocidental, que assiste a TV Globo e vê documentários e filmes no Multishow/History Channel/Fashion TV pensar que algum tipo de voz foi dada a quem morreu no WTC (O que elas pensaram? Quais foram seus últimos minutos? Quem sobreviveu?) e tantas outras histórias foram absolutamente ignoradas. Por que nos identificamos mais com os americanos? Por que valorizamos mais a vida de um americano? Por que conseguimos nos relacionar mais com a "tragédia vivida pelo povo americano" do com o que aconteceu em um pais tão não-desenvolvido como o nosso?

Justamente o nome de cada uma dessas pessoas que morreu será gradativamente esquecido. E o que ficará será o discurso oficial. O simbolismo. O monumento grandioso. A data onde as pessoas pararão durante 1 minuto para pensar em como vivem na melhor nação do Planeta.

Quanta idiotice.

P.S.- Terminando de escrever a monografia, sorry pelo desaparecimento e em caso de saudade desesperadora, sempre tem as minhas colunas quinzenais no Aqui só tem Bafon.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

19h40 no Rio de Janeiro

Eu sou economista. Ou melhor dizendo, sou um soon-to-be economista – estou nas minhas semanais finais de faculdade. Eu gosto da minha faculdade, eu gosto do meu trabalho. Eu gosto de estudar Economia - é bem menos matemático do que as pessoas pensam e é uma faculdade que obriga você a pensar sob perspectivas diferentes (se você teve a chance de estudar na faculdade que ensina Economia e não Finanças). Eu gosto do meu trabalho – acho interessante a adrenalina que os negócios desperta, o exercício de ter que ser mais sucinto (algo que eu necessito bastante... e que definitivamente não sou nesse blog. :D).

Mas alguns dias parece que eu sou tomado por um sentimento de apatia. Não que eu esteja triste ou insatisfeito com algum aspecto da minha vida. É só um sentimento de 'boredom' com a previsibilidade do mundo ao meu redor. Algo momentâneo, algo que tende a acontecer muito especificamente em segundas e terças-feiras. Você olha para as pessoas ao redor, as conversas e atitudes parecem previsíveis e funcionais demais. Independe do lugar: pode acontecer num deslumbrante dia de outono no Rio de Janeiro, um domingo de verão em Hamburgo ou uma quinta-feira em Paris de férias. São dias em que o meu indomável humor me permite somente fazer o estritamente necessário: compromissos, tarefas do trabalho, estar presencialmente numa aula da faculdade. Estritamente o necessário, porque todas aquelas coisas necessárias e rotineiras que deveríamos fazer no tempo 'livre' se tornam mortalmente entediantes. E eu sei que eu não adianta sentar e 'pelo menos tentar'. Eu preciso de algum estímulo externo, de algum momento em que a minha atenção esteja totalmente focada em algo que me faça parar de pensar no 'o que eu deveria fazer' e me 'transporte' para algum outro lugar.

São nesses dias em que eu vou ao cinema.

Hoje, após sair do trabalho (e depois de cumprir a minha nobre parte enquanto membro do sistema capitalista de produção :D), comprei meu Doritos e minha Fanta Uva (gastronomicamente abominável, gastronomicamente delicioso :D), fui ao Espaço Unibanco e comprei meu ticket para 'Meia Noite em Paris'. Sentei numa cadeira entre dois casais, um tanto quanto ridículo no meu terno e na minha cara de entediado e esperei as luzes se apagarem. E simplesmente viajei.

O filme começa com uma 'cruel' combinação de jazz com cenas de Paris que conseguiram derrubar a minha apatia no primeiro instante. Não sei se foi o jazz ou Paris, mas a combinação dois dois conseguiu derrubar ridículas e incontroláveis lágrimas dos meus olhos. De novo, não por uma tristeza específica. Mas só pela beleza sensível que os filmes do Woody Allen tem a característica de começar. Talvez pela lembrança de estar naqueles locais que agora já me são familiares, de lembrar de mim incrivelmente triste na primeira vez, incrivelmente feliz na segunda e terceira. De pensar na pessoa que me espera lá, de como eu inconscientemente sinto mais falta dela do que conscientemente percebo e de como relacionamentos a distância são incrivelmente cruéis, mas incrivelmente fantásticos quando acontece de você estar junto da pessoa, mesmo que seja por alguns dias.

Uma das minhas maiores implicâncias com atores de Hollywood seguramente é com o Mr. Owen Wilson – o acho canastrão, piegas, o estereótipo do ator americano sem muito conteúdo dramático e profundidade. Precisou de Woody Allen para que ele (Wilson) conseguisse me transmitir alguma empatia com algum personagem que ele interpretasse. A história do escritor americano fascinado por Paris cercado de práticos americanos que logo se tornarão sua família é muito mais cativante do que uma resenha de jornal/blog pode transmitir. Woody Allen conseguiu capturar uma nuance de Paris incrivelmente específica, incrivelmente tênue e que infelizmente demora algum tempo para que se possa captar. Paris é uma cidade dolorosamente nostálgica (em oposição a Londres, onde tudo parece estar se transformando em algo excitante, algo mais moderno, algo mais cool). Tudo parece remeter a uma época, um estilo de vida, um Zeitgeist que não existe mais. Tentando explicar em termos mais práticos, a sensação é a de estar entrando em um salão de festas onde aconteceu uma festa notoriamente fantástica, mas na qual você não esteve. As pessoas, sorriem, as pessoas fumam, as pessoas conversam, enquanto você, turista solitário com tendências melancólicas que toda viagem sozinho sempre acaba despertando, inevitavelmente se pergunta como seria se você conhecesse aquelas pessoas, se você estivesse naquele lugar, se você tivesse estado ali naquele instante. Ao seu redor, a horda de turistas japoneses e americanos, tirando desesperadamente fotos e correndo de um ponto turístico para o outro. E você se achando um louco por não estar fazendo exatamente a mesma coisa, com tantos lugares 'que você tem que conhecer!' naquela cidade – mas o número infinito de páginas de possibilidades do guia desestimulam cada neurônio do seu cérebro, e você decide ficar andando e andando por aquelas ruas invariavelmente bonitas.

A mensagem do filme pode ser mesmo que tendemos irracionalmente mesmo a achar que seríamos mais incrivelmente em algum outro momento: da história, das nossas vidas (se elas tivessem seguido um rumo diferente). Na minha opinião? De que todo mundo precisa de um pouco de ficção, de um pouco de surrealidade para mudar a perspectiva do presente, do racional, do agora. (Ah, Adrien Brody de Salvador Dali, com o seu perfeitamente enorme e fantástico nariz que me fazem esquecer qualquer vontade que eu teria de um dia de mexer no meu...).

E eu saí do cinema, caminhei para o ponto de ônibus na Praia de Botafogo, olhando para a vista fantástica que essa cidade sempre acaba proporcionando. Com o meu olhar ajustado, com o meu humor ajustado, com jazz ressoando na minha cabeça. E pensando em como um bom filme sempre acaba colocando qualquer mente inquieta de volta ao lugar, reequilibrando as doses necessárias de nostalgia, poesia e de ficção que precisamos tanto para levar nossas sérias vidas a frente. No Rio de Janeiro. Ou em Paris.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Sobre a difícil arte de criticar

Tenho uma lembrança exata desse momento, logo nos meus primeiros dias de faculdade na Alemanha (Checklist do Projeto “Tornar-o-meu-blog-uma-vitrine-para-mostrar-como-sou-foda-inteligente-AND-jet-setter”: menção ao período em que eu morei na Alemanha + menção ao fato de que eu efetivamente estudei em uma universidade européia: DONE). Era aula de “Interação Cultural” com a professora Iken (o arquétipo da intelectual alemã: alta, vestida com roupas e tons sóbrios, cabelo eficientemente cortado em Chanel, morou por 5 anos em uma comunidade tribal no interior da Namíbia), ela sentada no final da sala de aula e uma aluna alemã (Hanna) na frente fazendo uma apresentação em PowerPoint sobre um texto da disciplina. Apresentação ligeiramente chata, depois de 15 minutos de luta contra o meu permanente sono daquela época (o lado nada legal de frio + falta total de luz solar que é o inverno báltico), batidinhas de madeira muito educadas, aluna agradece e senta.

Frau Iken levanta e diz que quer um comentário de estudante estrangeiro sobre a apresentação. Óbvio que ela aponta para o “aluno de cabelo encaracolado, o com cara de espanhol”. Eu obviamente era o único com cabelo encaracolado naquela maldita sala. Sorriso amarelo no rosto (afinal, uma das piores coisas do mundo é obrigar um estudante a criticar a apresentação de um outro estudante – qualquer comentário menos empolgado do que “Foi ótimo, achei muito bom!” ou com mais do que 10 segundos é passaporte sem volta para o clube dos Rejeitados&Odiados. Eu não queria entrar nesse clube. Eu não tinha amigos naquela droga de cidade, e aquele combo de frio e falta de luz estavam me deixando deprimido.), e eu comento “Foi ótimo, achei muito bom!” e olhei para a professora com aquela cara de “Mi English no es muy good!”. A professora ri como quem diz “Eu te entendo...” e diz que quer a opinião de uma estudante alemã. Escolhe Sarah, uma loirinha com suaves olhos azuis e carinha de camponesa inocente das planícies de Jutlândia. Sarah abre a boca e manda:

- O slide 4 estava mal explicado, o slide 5 estava mal estruturado, o slide 7 foi superficial demais e poderia ter sido bem melhor explicado com os textos que foram indicados para a apresentação, o slide 10 e 12 estavam confusos e não muito claros. No geral ela falou baixo e um pouco rápido demais, mas foi bem interessante a apresentação.

Eu ri nervoso de tão chocado que eu fiquei. Olho para frente e vejo Hanna anotando todas as sugestões da Sarah com a cara mais “Sim, muito bom seus comentários, obrigada!” e voltando para sua cadeira com aquela cara de tranqüilidade de quem não precisa fazer mais uma apresentação. Eu olho ao redor procurando alguém para comentar “BAFÃO! Caramba, você viu isso?!”. Todo mundo com a cara mais normal do mundo. Eu olho para a professora, ela ri e fala que esperava exatamente a minha cara de surpresa. E começa a falar sobre a diferença da forma de criticar entre alemães e latinos.

Depois de algum tempo na Alemanha, óbvio que comecei a pegar o ritmo local (mas claro, quando EU fiz a minha apresentação eu comecei com uma mensagem prévia onde disse “Eu sou latino, eu sou sensível, na minha cultura críticas em 90% dos casos são levadas para o pessoal. Por favor, PEGUEM LEVE!” e todos os alemães riram e obedeceram a minha ordem) e comecei a tentar ficar frio quando passava por situações como essas. Óbvio que nunca consegui 100% - se existe uma pessoa que escuta críticas, leva para o lado pessoal e fica mal com isso, essa pessoa sou eu. Mas só consegui efetivamente ficar bem com isso quando eu peguei a lógica dos alemães nesse aspecto: a crítica sincera é a forma mais eficaz de melhorar algo. E de você dizer que uma pessoa tem capacidade para fazer melhor.

No ano passado, no período imediatamente posterior a um comentário meu em um post do blog do Tony Goés (to be found here) que gerou uma pequena celeuma parecida a que ocorreu nos últimos dias, escrevi um post (this one) no qual eu comentei alguns pensamentos meus sobre como é difícil ter um blog e principalmente lidar com o inevitável: as críticas das pessoas que pensam diferente de você. Relendo o post, ainda percebo que sustento integralmente o que eu escrevi naquela época. Abrir um blog a comentários é praticamente instalar um telhado de vidro acima de você com LED's piscando "Atire aqui". Mas sem os comentários, blogar vira uma via de mão única, sem o inestimável benefício de ter a sua opinião contestada e de te dar a possibilidade de pensar sob óticas novas, perspectivas diferentes.

E quando falo comentários, falo de comentários que analisam o que você escreveu. Todo blogueiro adora escutar elogios, todo blogueiro adora receber comentários positivos e, com o tempo, todo blogueiro perigosamente cria uma necessidade dos comentários elogiosos dos leitores mais assíduos do blog - que obviamente são os que mais se identificam e pensam como você. 99% dos leitores que leram seu blog uma vez e não curtiram não vão voltar a ler o seu blog. Dentro desse 1% que leu, não gostou, ficou puto/ofendido com o que você escreveu e se motivou a apertar o botão de comentários, a esmagadora maioria vai assinar como 'Anônimo' e meter o pau com o objetivo de te ofender pessoalmente. Agora, a pequena minoria que não concordou e que vai meter o pau em você com argumentos válidos, contestando com base no que você escreveu... esse é o tipo de comentário que com certeza faz valer a pena ter um blog. Esse comentário é aquele que vai fazer o blogueiro parar por 1 minuto e pensar "Será que eu realmente podia ter pensado de forma diferente?".

Sinceramente, achei o post do Tony sobre a morte do Bin Laden uma análise rasa e superficial. Parei para ler o post depois de um dia de trabalho + faculdade intenso (como infelizmente a maioria dos meus dias são:  sabe como é, infelizmente não dá para fazer uma ponte aérea "Brasil-Europa" sempre que dá vontade - Checklist do Projeto “Tornar-o-meu-blog-uma-vitrine-para-mostrar-como-sou-foda-inteligente-AND-jet-setter”: menção ao fato de que eu viajei para o Exterior nos últimos meses independente do fato de que somente viajei DUAS vezes para o exterior em toda a minha vida: DONE) e discordei de quase tudo do que ele falou ali. Apertei o botão de comentários e escrevi tudo o que eu pensei sobre o que ele tinha escrito - em muitas linhas porque essa a forma que eu escrevo, relacionando com as coisas que eu já li/escutei/estudei porque foram coisas que eu li e eu veio na hora falar - e enviei o comentário. Sob o meu nome, sob o meu avatar porque foi isso realmente o que eu pensei e porque acho incrivelmente bobo e covarde entrar um blog e enviar uma opinião sob a máscara do "Anônimo" e porque sou inteligente o suficiente para saber o Tony saberia que eu escrevi aquele comentário.

Sobre a resposta do Tony (que gerou toda a discussão) em si, acho que vale muito pouco a pena comentar, ele deixou claro os argumentos e prerrogativas dele num post do blog dele que todo mundo leu e ponto final. Sobre o Tony as blogueiro, tirei cinco minutos do meu dia (quando poderia estar levando 'meia hora de rola' - Anônimo, você nem sabe o quanto faria bem pelo menos meia hora... :D) para comentar sobre aquele post porque achei e acho que ele tem capacidade intelectual de sobra, experiência de vida (que infelizmente eu não tenho - concordo plenamente que muita coisa só se aprende com o tempo: mas não tudo) e leitura de boas fontes o suficiente para ter escrito algo melhor e mais fundamentado. Já entrei em milhares de blogs, leio assiduamente os que estão no meu blogroll e comento nos quais acho que vou ter uma opinião diferente ou concordante sobre aspectos que me interessam e onde sei que o autor pode rebater a altura/mesmo nível. That is it. Foi isso que aconteceu naquele post, concordo quando Lucas T. disse que "Pensei que pela sua idade avançada (sorry, não resisti) fosse kind of imune a certos comentários e "retaliações".", acho que os comentários "Incrível seu texto! Muito bom!!!" redundantes e sinais de uma necessidade de atenção e carência desesperada por parte da figura do leitor que eu não consigo entender e ponto final. Continuarei lendo o blog 'Tony Goés', continuarei comentando nos posts em que eu discordar e achar que vale a pena mesmo falar alguma coisa, continuo achando o Tony um cara interessante por toda a experiência de vida (completamente diferente da minha) e (mais uma vez) ponto final.

Sobre os comentários gongativos em relação ao blog (que obviamente vocês sabem que eu li - e o melhor de todos, seguramente, é o do 'O Gato Comeu' e "...tony sinto que no fundo vc tem um coração, o fernando eu já não sei, parece que ele tem uma calculadora de milhas de viagem no peito." - Lieber, Ryanair é uma empresa onde as comissárias de bordo vendem bilhete de loteria durante o vôo e que tem planos de vender passagens onde os passageiros voarão em pé. Você realmente acha que eles tem programa de milhagem? Mesmo?!), claro que eu fiquei (por cinco segundos - tempo que a minha hiperatividade me permite ficar focado em alguma coisa) chateado, claro que eu repensei sobre a utilidade de realmente blogar e colocar a minha cara a tapa na blogsfera. Óbvio que ler "Não gosto do blog do tal Fernando. Posista, pernóstico, deslumbrado. Prolixo ao extremo. Despreza solenemente a inteligência de quem se interessa pelo que ele escreve." me faz pensar se eu levei o meu blog na direção correta, se realmente eu reflito quem eu sou e o que eu realmente penso no Lost und Found in Translation.

Mas e daí que eu sou considerado "prolixo ao extremo"? (Momento "Abrindo meu coração": fiquei durante anos grilado com o fato de eu sempre usar muitas palavras e informações para falar sobre qualquer coisa até o dia que, em um date com um russo, eu comentei que adorava Dostoievski e o FDP respondeu "Dá para ver. Você não pára de falar. Eu odeio Dostoievski.". Sorri amarelo, levei o date até o final da noite, deixei o cara visivelmente puto quando falei que queria ir para casa. E continuei lendo Dostoievski e seus calhamaços cheios de frases intermináveis.) E daí, por ser crítico ao capitalismo, eu sou considerado "comunista de butique"? (uma das minhas melhores amigas - uma das pessoas mais inteligentes e brilhantes que eu conheço, uma das poucas que leu Marx, conseguiu entender 5 linhas do que ele escreveu e que eu consigo sinceramente chamar de "comunista" - riu ALTO com essa. Justamente por saber a profundidade e conhecimento que eu tenho sobre qualquer coisa que Marx já escreveu. :D) E daí que eu sou considerado "esnobe" e eu seria "muito sabe-tudo, é muita finesse adquirida que essa gente (nós míseros leitores) não tem, muito conhecimento pronto e acabado, economia, enologia, linguística, história universal..."? (Bem, os posts sobre a minha crise de Mid-20's ou sobre o meu 'desconforto' por eu, na verdade, eu ser suburbano estão ainda no ar.) E daí que eu "endeusaria a minha experiência de intercâmbio na Europa"? (O primeiro post do blog também ainda está no ar e explica muito do que me motivou a começar isso daqui)

No fundo, é como um grande amigo resumiu hoje em um email para mim. "Mas esse é o preço de se expor na internet. Deixar que alguém que só enxerga uma moldura sua te imagine por completo.". E o que eu posso fazer? Convidar cada um dos anônimos a ler os posts que eu linkei acima e meter o pau em cada um deles - com argumentos, bien sur. E that's all.

E continuemos com a programação de sempre.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

The English Dream

Antes de escrever esse post, eu me peguei pensando em como eu poderia introduzir o assunto que eu quero falar. Eu poderia fazer um enorme post descrevendo o surgimento do conceito de nacionalismo como doutrina e ideologia no final do século XVIII, citar alguns grandes autores e ensaístas da época para dar um respaldo intelectual, puxar um gancho para meter o pau em algum aspecto que supostamente considero decadente da sociedade brasileira contemporânea (acho que alguns leitores mais erráticos do blog realmente acreditam que eu tenho um globo terrestre na minha casa onde todo dia antes de dormir eu espeto uma agulha no mapa brasileiro falando "Terrinha maldita! Deuses da Economia, mandem uma crise para esse país de quinta e façam com que essa classe média medíocre passe a não ter dinheiro nem para passar um final de semana em Pedro Juan Cabellero!", passo a mão suspirando "Um dia eu volto, um dia eu volto..." por todas as estrelinhas douradas coladas sob as capitais européias que eu conheci, desligo a luz do quarto e vou dormir abraçado com um travesseirinho com fronha "I (heart) Europe"), fazer alguma previsão pessimista-deprimente-catastrófica sobre os próximos acontecimentos e terminar o post com uma mensagem de esperança para não deixar os meus leitores muito deprimidos e tentar aliviar um pouco a minha fama de "chato-corta-barato".

Mas obviamente a forma informal de começar a falar o que quero é BEM mais interessante. E enrolar lingüiça para tentar pagar uma de intelectual 'meu-maior-sonho-é-fazer-mestrado-sobre-os-trabalhos-de-(inserir nome de autor de nome difícil, com trabalhos controversos e textos absolutamente impossíveis de ler)' é algo que eu já faço diariamente na minha querida faculdade de Economia, portanto... não preciso fazer isso aqui no blog e... lá vai!

(Primeiro, imagina uma coisa 'campo florido', uma coisa Grieg, uma coisa 'comercial de perfume floral francês'. Foi? Não! Não rola imaginar Holambra porque interior de São Paulo logo vai desembocar em Monteiro Lobato, Sítio de Picapau Amarelo com aquela dona Benta chata entupindo todo mundo de comida gordurosa, tradições do interior brasileiro e quando você menos esperar Barretos vai aparecer e vai foder com o que eu quero que você pense. Tem que ser campo florido de região de clima temperado. Rola imaginar Rio Grande do Sul - se na cidade próxima não tiver Festival da Uva/Maçã/Lichia Fúcsia nem Rainha/Princesa do Festival tentando convencer que vale super a pena viajar até Porto Alegre/Curitiba/Florianópolis, se enfiar num carro por 20503 horas para chegar numa cidade perdida no meio do nada e comer 20504 variações do mesmo legume/fruta nas mais diversas e calóricas possibilidades.)

Em algum momento do século XVIII, as grandes nações européias caíram na real que a lânguida-virgem-e-frágil-camponesa-louca-para-dormir-com-o-tratador-de-cavalos-do-vilarejo era absolutamente iguais na Normandia, na Baviera e na Jutlândia - impossíveis de distinguir uma da outra. Perceberam que precisam denominar uma fronteira, um idioma, uma capital para cada um dos países que eles tinham na cabeça. E claro, o mais importante: inventar uma série de tradições, lendas, mitos e valores que cada uma das queridas nações européias deveria representar.

E nisso os franceses saíram pegando logo o conceito de luxo, sofisticação e finesse (confessa que não dá para imaginar que um lugar com um nome tão chique como "Noisy-Le-Sec dans Seine-Saint Denis" é isso); os alemães, o conceito de burguesia intelectualizada, esclarecida e filosófica (rá-rá-rá); os italianos, a tradição representada pelo Império Romano e a sofisticazione representatta per il idioma italiano; e daí para frente.

Obviamente os ingleses não ficaram para trás. Olharam para o diabo daquelas ilhas chuvosas-e-cheias-de-ovelhinhas, pensaram na bosta que era ainda ter que dividir aquilo tudo com povos super civilizados como escoceses, irlandeses e galeses e ter que fingir que Edimburgo, Dublin e Cardiff super eram tão importantes como Londres. Olharam para o outro lado do Canal da Mancha, viram os franceses dando uma esnobada para eles, pensaram "Isso vai dar merda, temos que unificar essa porra aqui.", até que... provavelmente algum Lorde em alguma sessão levantou a mão e disse "Já sei! Vamos complicar ao nível do absurdo qualquer aparição daquele inútil do Hampton Court Palace! O símbolo britânico vai ser a Família Real! O símbolo britânico vai ser o protocolo!".

Daí já viu: algum inglês perdido em alguma manufatura inventou alguma máquina a vapor que deu meio certo, a Inglaterra ganhou rios de dinheiro, percebeu que o maravilhoso exemplo de administração das próprias Ilhas Britânicas tinha que ser repetido em outros lugares do mundo, simpaticamente convidou a Índia e metade de África para tomar chá todo dia com eles, começou a arranjar quizumba com os franceses, começou a arranjar quizumba ainda maior com os alemães, se fudeu porque o povo missionário-mala do Mayflower copiou todas as máquinas deles e ficou ainda mais bafônico e rych do que eles, metade das colônias resolveram ser pobres e miseráveis sem o passaporte britânico (e ter a emoção de poder imigrar legalmente para o Reino Unido!), Londres passou a ser uma cidade cool-but-not-so-cool-as-NYC e ponto final.

Mas depois de todo esse tempo a merda já estava feita, e o mundo estava convencido: os britânicos eram os representantes mais fleumáticos do protocolo. E as imagens de uma família britânica branca-loirinha-e-dentucinha (absolutamente indistinguível da Família Real da Áustria, Rússia, Espanha ou Alemanha) acenando da sacada do Buckingham Palace, roboticamente impecável-simpática-e-grata-pelos-contribuintes-não-terem-os-decapitado (França tá ali do outro lado, gente!), cerimônias cheias de firulas e sem o menor sentido prático e funcional em democracias modernas e esclarecidas mas que supostamente remetem a tradições milenares criadas no século XVIII e banquetes onde Lordes e Ladies de Cheddarham ou Fuckinghamshire comparecem e as mulheres sustentam absurdos-e-cafonérrimos chapéus correm o mundo. Em nossas simples repúblicas, semelhantes farras faraônicas com o dinheiro público levariam a processos, provocariam indignação popular, impeachments ou derrota do presidente nas próximas eleições. No reino encantado das Ilhas Britânicas? Provocam um suspirinho de "Ah, como é romântico ter uma Família Real como os ingleses tem...".

Semana passada em Paris eu me deparei com um dos periódicos mais lidos das terras gaulesas estampando na capa uma foto de Kate e William e uma manchete "British so Cool". Basicamente uma lista, escrita por jornalistas franceses, dos motivos pelos quais os britânicos eram muito mais cool do que os franceses. Dois minutos de choque (Francês elogiando inglês? Que porra é essa?!) precedidos de uma rápida olhadela ao redor para uma Rue des Martyrs absolutamente deslumbrante sob um céu completamente azul de primavera e parisienses casualmente bem-vestidos comendo+fumando do lado de fora de elegantes pequenos bistrôs e a minha cara de "Como os ingleses são mais cool que os franceses?!". Tudo bem, eu sei: auto-flagelação e reclamar da 'decadência da sociedade francesa contemporânea' são atividades nacionais francesas favoritas e a França não se restringe ao arrondissements elegantes de Paris. Mas ao mesmo tempo (e todo mundo que teve amigos ingleses pode confirmar), por que diabos sempre acabamos associado ao conceito "Britânico" uma imagem fina-refinada-e-trenchcoatiada e nunca a imagem que todo mundo sempre mais vê em Londres?!

Enfim, tudo isso para dizer que acho muito bonitinho as thousands Union Flags espalhadas por Londres, muito simpático todo aquele povo farofeiro-cheio-de-dente-mal-tratado acampando em frente ao Palácio de Buckingham para ver um monte de batedor da Polícia Inglesa cobrindo o Rolls-Royce da noiva, muito interessante o fato de que o vestido que Katherine Middleton irá utilizar é um assunto mais importante para a Folha (e pelo que parece, para o mundo) do que o massacre que as tropas do Gaddafi estão provocando em Misrata. But, engolir soft power britânico e ficar bradando bandeira britânica e suspirando pela pompa e tradição britânicas não rola. Londres é absolutamente imperdível, a Inglaterra é fofissimamente vários dos clichês que eu tinha criado na minha cabeça antes de ir e toda a tradição imperial realmente é legal e vale a pena ser vista e compreendida. Mas comprar esse idéia de que britânico ainda é um povo educado que toma chá às cinco e que é aquela imagem inatingível de formalidade e sofisticação... no way. Não tenho paciência nem saco.

(Que sobrevivemos ao dia de amanhã, dear Lord...)

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Arrêtez tous les bonnes boissons!

Ok, pequeno quiz para os meus leitores.

Pergunta: Onde estou?

Dicas:
#1: Eu consigo chegar do aeroporto a cidade pegando um simples trem (ja o mesmo nao se pode dizer do Rio, neam? Pqp - demorei quase 2 horas + um taxista que me enrolou para sair da ZS e chegar naquele diabo chamado Ilha do Governador. Num trajeto que normalmente demora 30 minutos, mas que consegue a facanha de pegar tanto o engarrafamento de quem entra e de quem sair do Rio! Detalhe: morri uma fortuna no taxi para nao chegar atrasado... e o voo saiu 30 min porque a "tripulacao ficara presa num engarrafamento". Sweet...)
#2: Tem restaurante indiano na esquina. E logo depois, um antilhano. E por perto, um ruandes. :D (Ou seja: PF de bife de contra-file com batata-frita my ass!)
#3: Eu estou usando trench-coat. E barra da calca dobrada. E cachecol. ;D (E ninguem torra a minha paciencia que eu estou de crossover de "ingles com calca de Chico Bento" porque isso é IN aqui... :D)
#4: Tem uma H&M por perto. (O QUE? TEM UMA H&M POR PERTO?!)
#5: Fernando esta absurdamente feliz porque esta lembrando de uma parte dele que estava latente ha meses: a curiosidade de perceber com o outro pode ser tao diferente... e tao fantastico. :D


E ai? Deu para descobrir?

(Ah, dica #6: Na porra desse lugar os teclados tem uma ordem diferente, o que torna escrever uma atividade total "Tia cega catando milho".)