quarta-feira, 3 de março de 2010

Cadernos de viagem. Budapeste. Parte 2.

Passeios, experiencias (e furadas). Parte 1.
Budakeszi Üdvözlöm! (Bem-vindo a Budakeszi!)
A saga para chegar a Budapeste (ou melhor, Budakeszi) voces puderam acompanhar aqui. O que aconteceu depois? Vambora e aprendam o que vocês nunca deverao fazer uma viagem.

Depois de quase oito horas de viagem enfiados naquela van hermeticamente fechada (inverno europeu - abriu a janela = congelou), cheirando a Cheetos e do lado de um casal tipo S2 mais "Look! There is a bird! It's so romantic!" + selinho (com claro, automático suspiro de putice meu) até foi um certo alívio chegarmos ao nosso hostel mesmo que ele fosse nos quintos dos infernos. Na verdade, a minha maior preocupacao era com o fato de que o motorista da van (o tuga hetero gostoso - H, se voce ler esse blog, I will always be your fan! You know it!) simplesmente desmaisse ao volante depois de todo esse tempo: a espanhola e eu nao tínhamos carteira de habilitacao, o outro portugues era menor de idade e os americanos nao sabiam dirigir carros com marcha. Smart, nao?


O alívio durou até o momento em que saímos da van, conseguimos tirar as nossas colunas da posicao black old man e demos uma olhada ao redor. O lugar? Um buraco no meio do nada. Estávamos no subúrbio de Budapeste! Raiva: eu já morava mal no Brasil, tinha me acostumado a easy life de Hamburgo, ficado nos melhores endereços nas capitais européias; o hostel de Praga era ridiculamente barato e central. Iríamos pagar para ficar no meio do nada?! Hmpf! Fechei a cara e liguei a atitude diva (como se algum dia eu a tivesse desligado).
O hostel? O hostel era realmente um buraco. Em um buraco. A espanhola que reservou o hostel acabou fazendo isso por ter lido que estaríamos somente a 15 minutos do "centro" de Budapeste. Estávamos a 15 da Moskzva Tér, que distava outros 15 do Danúbio e dos principais pontos históricos da cidade. Merda. Batemos na porta, uma daquelas típicas senhorinhas da Europa Oriental me saí somente de robe (e cara de puta, claro, afinal eram quase 23h) e nos apresenta a "pensao" (= o puxadinho: os andares superiores da casa tinham sido transformados em 3 quartos e dois banheiros, e os inferiores eram onde eles viviam, com somente uma entrada em comum conectando tudo).

Os quartos? Como voces podem ver pela minha cara de feliz na foto acima, praticamente um Fasano Ipanema: quádruplos, com jogo de lencois e edredons com tema de oncinha. Na hora da divisao dos quartos, tive um insight MARA: todo mundo tinha percebido que o casal de americanos without notion digamos... tinha o nao muito agradável problema de ressonar levemente (levemente comparando... a um jato em partida ou um porco com enfisema pulmonar) - tipo, os dois juntos. Depois de oito horas de viagem, mais 5 minutos com eles e eu cometeria um assassinato com requintes de crueldade. Fiz um momento auto-reflexao (Fernando parando com o pezinho para o lado, carinha pensativa): eu era o único viado num grupo de heteros gostosos, solteiros e super legais (e sem chance de rolar nada. Tanto viado bem resolvido mundo afora, vou dar em cima justo de um cara que nao sabe fuder com outros caras? No way!). Teria que aturar dias e mais dias de "Look! What a hot girl, man!", inclusive em portugues (o tuga gato é a versao hetero da Samantha. Ódio.). Estava naquele buraco decorado com jogo de oncinhas = glamour zero. Eu tinha que dormir direito! Meu momento Madre Teresa de Calcutá? Sorrateiramente me joguei no mesmo quarto que o outro casal de amigos. Pela matemática do grupo, o meu outro amigo americano de Montana ficaria na cama do meu lado (loirinho, designer, gatcheenho - ÓTEMO) enquanto os irmaos tugas acabaram ficando no outro quarto com eles.


Licoes aprendidas? Primeiro: viagem no inverno, investe num hotel ou hostel mais bacana (liberta o judeu de dentro de voce, Jacob!). Aquela máxima que nós, brasileiros, aplicamos em viagem (hotel serve só para dormir) nao funciona quando está nevando e fazendo -3°C lá fora. Segundo: depois de perguntar qual a preferencia, quantas vezes na semana ele malha e se ele é afeminado ou nao checa com aquele contato local se o bairro onde voce vai ficar é central, bom de transporte, etc. A felicidade ou o inferno das suas férias muitas vezes distam somente algumas ruas uma da outra.


Budapest's First (and almost last) Meal
Depois de estacionar o carro, colocar as coisas nos quartos, filhadaputamente empurrar os portugueses para o quarto do casal "roncando unidos", ter uma crise "Angela Bismarchi voltando para Cascadura depois de terem matado Ox", superar essa crise, chegou a hora do next step: comer! Afinal, nao comíamos nada desde a parada no Mac Donalds no interior da Hungria, e eu vinha educadamente recusando tudo o que o casal S2 da nossa viagem me oferecia depois que o meu amigo americano insinuou que os biscoitinhos que eles levavam estavam completando algumas semanas de aniversário (#Activiafeelings).


Tudo bem: já eram 23h, mas em qualquer capital européia de médio porte encontrar qualquer lugar para comer nao seria nenhum grande desafio. Mas claro, essa é uma viagem told by LostundFoundinTranslation: alguma merda tinha que acontecer.
Mico#1 "Ah, vamos andando... Deve ter alguma coisa por perto!": Claro que tivemos a idéia genial de ir buscar um lugar para comer às 23h, num país estrangeiro, sem falar a porra do idioma local, no inverno centro-europeu, à pé. E claro que papai-do-céu nao ía deixar essa passar sem zoar bonito com a nossa cara.   Rua principal, olhamos para esquerda (nada), olhamos para a direita (somente uma loja beeeeem longe ainda aberta), resolvemos ir checar. Surprise, surprise: um estúdio de bronzeamento artificial 24h. Uma atendente com cara de entendiada e jeitinho todo biscate de ser nos informou que nao tinha nada para comer ali além de bebidinhas Valentino's tanning enhancer, fez aquela cara de "Ai? Um lugar aqui pra comer? Num sei..." (ódio de gente que faz essa cara!) e eu saí dali pensando que mente de negócios insana resolve explorar a demanda de "pessoas-que-acordam-no-meio-da-madrugada-e-resolver-retocar-a-marquinha-de-biquiní" (que, até entao, eu pensava se resumir somente à Valesca Popuzuda e semelhantes). Tem horas que o mundo me assusta.
Mico#2 "Ah, todo mundo sempre aceita euro mesmo!": Andamos mais 700m rua abaixo, eu dei mais 3 escândalos (tava frio pra caralho, eu tava com sono e... eu tava com medo do escuro! Ah, eu era o único gay do grupo: eu tinha esse direito!) e chegamos a um mercadinho muito do xexelento. Esperanca: o mercadinho parecia saído diretamente do período comunista (porra nenhuma nas prateleiras), os precos eram de Zona Sul (#momento SP friendly: supermercado carioca onde somente gringo, celebs e celebs wannabe fazem compras, afinal todo carioca sabe que num Zona Sul, os produtos sempre custam preco real + acréscimo pelo direito de imagem de estar sendo vendido num Zona Sul), mas pelo menos qualquer coisa era melhor do que coisa nenhuma.

O atendente (que fumava do lado de fora com um amigo encapuzado - no Brasil, nem pelo caralho cravejado de diamantes eu entraria naquele mercadinho) entrou pensando "Cada merda que me aparece a essa hora..." simpaticamente nos perguntou no que ele poderia nos ajudar. O casal S2 já foi catando tudo o que eles viam pela frente e foi para o caixa. Eu já tinha agarrado uma barra de chocolate húngara e criado uma relacao nutritivo-afetiva com ela. Na hora de pagar: euros? Non, non, non. Somente florins húngaros eram aceitos. Ódio.
Mico#3 "Quando voce decidir que mais uma camada de roupa nao será necessária... ela o será!": O atendente nos deu a dica que tinha um Mac Donalds non-stop (no Leste Europeu nao é 24h: é non-stop) logo ali. Continuamos andando rua abaixo. Frio. Vento. Temperatura de 0°C. Uma rua de casas operárias seguramente ainda do período comunista. Nada de calcada, andando por entre matinhos, areia úmida e buracos (já perceberam que eu atóooro um drama, néam?). Eu nos meus melhores sapatos comprados com o meu primeiro salário de estagiário, numa das melhores lojas de Hamburgo. Eu puto. Muito puto. (Uma coisa é ficar com fome, quase ter uma hipoglicemia, ser morto/assassinado/distrinchado no subúrbio qualquer de Budapeste. Outra MUITO diferente é estragar as minhas roupas e sapatos. Imperdoável!). Quando falo que andamos, I mean it: andamos mais de 2km até chegarmos a um enorme complexo comercial (do tipo com hipermercado Tesco, concessionárias, lojas de equipamentos esportivos, etc). E voilá: Le Mac Do'.
Mico#4 "I would like to order twenty-six cheeseburgers to go, please.": Imagina que voce é um Mac Slave húngaro, em mais uma madrugada de trabalho num Mac Donalds de um subúrbio qualquer de Budapeste. Voce tá lá, registrando pedidos de um bando de casal de namorados chatos quando de repente, saindo do meio do mato, surge um grupo de jovens encapuzados vindo na sua direcao. Esse grupo era a gente. Chegando no Mac Donalds. Elegante. Chique. Refinado.


O Mac Donald's já tinha fechado, somente o drive thru estava aberto naquela hora e ainda tínhamos 3 carros na nossa frente. Congelando busquei um cantinho onde o vento nao batia, e deixei os garotos resolvendo a questao dos hamburgueres. Quando de longe, escuto o " No.... No English!". Fudeu: o Mac Slave nao falava nada de ingles! Fui para frente da caixa de vidro e comecei: "Francais?" No. "Italiano?" No. "Deutsch?" No. "Esperanto?" No. "Língua do i?" No. Nada! Eu queria esganar aquele Mac Slave burro! Quando eu já quase desistia (e me acostumava com a idéia que desenvolver uma anorexia seria a única solucao para aquela noite), eu me lembrei: ainda tinha uma língua! "Russkiĭ?"DA! Ele falava russo!!!


Parênteses para agredecimentos importantes: 
#1: obrigado dominacao soviética na Hungria. E foda-se história (my ass: meu cheeseburger em primeiro lugar!)! 
#2: obrigado para mim mesmo por um dia ter tido a idéia mais nerd ever - passar o verao de 2005/2006 estudando russo no Centro de Cultura Eslava. Eu gastei um dinheiro que poderia ter ido para me deixar + gostoso (= musculacao em qualquer academia) aprendendo um idioma completamente inútil, eu nao peguei/conheci ninguém de gostoso naquele curso, a classe era feita na maior parte de garotas estudantes de história da PUC (equals patricinhas achando que tem consciencia social), o professor nao era russo mas... acabei tendo um dos melhores veroes da minha vida. Quem diria que anos mais tarde o meu russo iria me ajudar... a pedir 26 cheesburguers num Mac Donald's num subúrbio de Budapeste?! Claro: sem contar todos os russos que eu conheci durante esses anos. Aaaah, GRANDE Rússia!


Depois de pedir 26 cheeseburgueres (quase nunca falo russo. Lembrava do "dois", do "seis". Queriam o quê, poxa?!), come-los feito um mendigo debaixo da marquise de um Tesco fechado, com vento e chuvinha batendo... fomos fazendo o caminho de volta. Pula pocinha de lama, desvia de canal de água, pula buraco na rua. Encontramos um posto de conveniencia ainda aberto, compramos alguns chocolates (pagando um valor absurdo na conversao de euros > florins) e continuamos o nosso caminho para casa.


E eu ainda me perguntando: por que diabos nao tínhamos ficado em Praga?!!!
(continua...)

8 comentários:

Daniel Cassus disse...

finalmente encontrei alguém que compartilha da minha visão sobre o Zona Sul.

Acho que está na hora de eu investir num curso rápido de russo também.

Red disse...

Adorei o momento SP-friendly! Obrigado por pensar em nós paulistas!

tommie disse...

Mas o Zona Sul tem algumas qualidades, como ter alguns produtos que os outros não tem, e alguns produtos, por assim dizer, mais sofisticados, lá são mais baratos que nos concorrentes ´populares´. O próprio Pão de Açucar, que durante anos teve aquela cara de supermercado de rico, anda baixando os preços.

K. disse...

Aparentemente, sua Budapeste tem bem pouco a ver com a de Chico Buarque!

(o bom de passar por situações bizarras em viagens é que elas criam umas lendas para serem contadas por aaaaanos depois!)

Fernando disse...

@Daniel: O curso na Cultura Eslava tá começando por esses dias. Super vale a pena: o curso é divertidíssimo, sempre tem gente maneira (e nerd!) e o professor é member! :D

Fernando disse...

@J: Sempre pensando nos paulistas/paulistanos, darling. :D

Fernando disse...

@tommie: O ZS realmente disponibiliza alguns produtos que são impossíveis de encontrar em outros supermercados. BUT... o feijão com arroz básico sempre sai BEEEM mais caro no ZS. Palavra de quem morava perto de um ZS e caminhava um pouco mais para ir até o Mundial (chique, néam?).

Fernando disse...

@Leandro K: Sabe que ainda nao vi o filme do Chico? É bom? Um dos húngaros que eu conheci lá viu e falou que adorou o filme.