quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Um ano

Há exatamente um ano, eu me sentei em frente ao meu laptop Toshibão-velho-de-guerra (que morreu Agosto passado, levando TODAS as minhas originais das fotos dos meus primeiros seis meses na Europa) e olhei para a janela do meu quarto, que dava para o jardim da residência estudantil. O que eu vi? As árvores, com suas folhas em tons de dourados e amarelo e vermelho, mostrando que o outono hamburguês já tinha chegado para ficar. Absolutamente deslumbrante (para mim, até hoje o outono é estação do ano que eu mais prefiro em países temperados. Fuck off! Black Eyed Peas e Stereolove tocando nos Beach Clubs das capitais européias - eu quero é mais andar elegantemente vestido num sobretudo+cachecol num parque com folhas caindo e sentindo os raios de sol tocarem levemente no meu rosto – sem causarem queimaduras de octogésimo grau como acontece no Rio). Mais uma vez eu relembrei de como eu estava longe de casa, de como aquilo tudo era diferente de tudo o que eu já tinha vivido, e o mais importante: de como eu tinha batalhado para ter tido a oportunidade de ter visto aquilo. E o que eu sentia naquele momento? Nada. Absolutamente nada.

Foi nesse instante que eu cheguei à conclusão que tinha que colocar mesmo aquilo para fora. (Não, you nasty readers, não era *aquilo* - até porque, sendo beeeem sincero, *aquilo* era posto para fora com bastante regularidade em terras européias :D). Aquele sentimento de apatia, de “Que bom...”, absolutement blasé... tão típico de alguns amigos super acostumados a viajar inúmeras vezes para destinos internacionais (ainda reviro os olhos para quem tem a coragem de falar “Ai, acho Londres/Paris/NYC so boring...”. Capital mundial não se acha “boring” – no máximo se prefere uma a outra, mas nunca se “Ah, não curti” uma delas. Se você não consegue encontrar algo nada menos do que absolutamente fantástico em cada uma dessas cidades, você não tem cérebro e faz o favor de ir num Orlando Fly&Drive nas próximas férias e não enche o saco!) não podia estar acontecendo comigo. Justamente eu, que (verdade verdadeirissima) planejava aquela porra de viagem desde os meus 6 anos, quando ganhei o meu primeiro atlas mundial (enorme, quase da minha altura) e fiquei fascinado com aquelas páginas cheias de mapas e fotos sobre os mais diferentes lugares do mundo. (Na verdade, esse atlas também me provocou a minha primeira crise “Ninguém me entende!”. Ganhei o Atlas, fiquei todo feliz, levei para o colégio crente que todo mundo iria compartilhar do meu “Que foda!” ao ver aquele livro gigante. Entrei na sala com um sorriso de orelha-a-orelha, falando “OLHA QUE LEGAL O MEU NOVO LIVRO!”. 3 pirralhos vieram, olharam durante 5 segundos e o jogaram no chão. Outro idiotinha ainda ameaçou pisar, só parando quando eu olhei para ele com aquela cara de “Toca seu Conga no meu Atlas que eu arranjo um jeito de arrancar seu pé com aquela tesoura sem ponta, toca!”. Peguei meu Atlas do chão, fui para a minha e Pah! nem confiança. Eles nunca me entenderiam mesmo...) Justamente eu, que tinha ficado quase 2 anos planejando, mandando e-mails para empresas (C sabe como eu suei na minha primeira entrevista de estágio por telefone ainda aqui no Brasil, em alemão!), juntando grana (e aprendido que MUITOS reais viram pouquíssimos euros - e para sacanear, o euro mega desvalorizou durante a minha estadia na Europa. Pode isso?!) e o mais importante: criando coragem para enfrentar aquele monstro que parecia a viagem à Alemanha (amigos, quantas vezes eu falei “Desisto? Vou para o Paraguai mesmo!”?). Justamente eu, que tinha conseguido ir, ver e vencer (o choque inicial do aeroporto de Frankfurt, onde eu passei 30 minutos olhando perplexo para a mulditão saindo dos portões e tive um branco linguístico completo; Berlim, Copenhague, Estocolmo e Londres até então; Estágio numa das maiores empresas alemãs), que não tinha a mínima idéia de quando poderia viver aquilo tudo de novo (Campo Grande fica tão longe da Europa...) e eu... não conseguia ver como era foda estar vivendo aquilo tudo?! Parecia que eu tinha perdido a minha principal característica: o brilho no olhar, a empolgação de viver as coisas pela primeira vez, aquele tipo de deslumbramento fanstástico e saudável de viajar para o exterior pela primeira vez. “O que tinha acontecido comigo?” era o o que eu me perguntava naquele momento.

Eu só sabia que eu tinha que escrever. Se eu achava, naquela hora, que algum iria se interessar pelos textos? Nunca!: a gente nunca começa um blog realmente acreditando que alguém vai se interessar por aquilo que a gente tem pra mostrar. Não sabia se seguia o estilo sucinto-e-antenado do Daniel, a sofisticação em muitas linhas do Thiago ou estilo desbocado-se-você-não-curtiu-my-ass dos relatos de viagem Ana Karina. Não sabia se as pessoas teriam a paciência de ler os meus inevitavelmente longuíssimos textos, com milhões de referências (eu juro: eu escrevo o texto, eu releio, eu tento enxugá-lo... e qualquer tentativa de tirar qualquer parte do texto leva muito mais tempo do que escrever o texto em si, eu encho o saco e posto o texto cheio e voilá) e piadinhas internas. Acima de tudo, não sabia se interessava para as pessoas saber das histórias de um carioca suburbano maluco perdido pelo norte da Europa.

E veio o primeiro post, onde eu fiz uma desconstrução do sonho europeu, do meu sonho europeu (não aguentava mais “Como assim você tá triste?! Você tá na Europa!” quando o que eu mais queria era alguém para falar que me entendia!). O segundo post, onde eu tentei fazer uma análise crítica e ácida da Bratwurstland, bem ao estilo “Eu odeio, mas estou amando esse país!”. O terceiro, onde eu sentei PUTO da vida depois da minha flatmate ter me negado a usar uma panela... e que me gerou o primeiro comentário (de quem? De quem?)!

E aí veio a vontade de postar cada vez mais, os detalhes da minha vida alemã, deixar registrada cada impressão boba e idiota sobre a minha vida em Hamburgo. E vieram as viagens! Ah, as viagens: porque eu não tive a ideia antes de deixar tudo registrado! Tantas horas de tédio mortal, de solidão, de saco cheio de ficar vendo museu+lojinha+centro cultural. Pra quê companhia de viagem quando se tem um laptop, um continente com ruas seguras, um maço de cigarros (Dunhill Blue, always!), uma mesa de café do lado de fora para se sentar, uma xícara de chá, uma tarde inteira pela frente e leitores interessados no que você tem para dizer?! Lisboa foi tão mais rica, tão mais produtiva do que Londres em termos de memórias e impressões, tanta coisa mais ficou registrada e foi tão legal ler as respostas dos leitores, curtindo a viagem comigo.

E veio a volta ao Brasil, a dúvida se vocês continuariam se interessando pelas minhas opiniões críticas e ácidas, agora voltadas para algo comum e nada exótico para vocês: a minha vidinha de universitário carioca. O questionamento “deveria ou não continuar a escrever o blog?”. (Blogueiros: Quantas vezes vocês já pensaram em dar um fim nos seus blog? :D Eu inúmeras, quase uma a cada dois meses ou quando recebo um comentário gongativo!) A readaptação a vida brasileira, de universitário e estagiário, sem grana, mal com tempo para me dedicar e escrever as inúmeras coisas e projetos de séries textuais para os meus interessados leitores (que eu defino como heteros e bichas chiques e inteligentes!).

Enquanto escrevia esse texto hoje eu passeava pelo blog, abrindo os arquivos, relendo alguns dos meus posts preferidos, relembrando de como eu escrevi cada um deles, tentando ter algum insight, alguma sacada para escrever algo na linha “O Lost und Found in Translation faz um ano, e quem ganha o presente é você!”. Fracasso total: primeiro, porque originalidade passou, mandou um “Oi, me liga bee!” e foi pra Farme. E segundo?

Segundo, posso falar sinceramente? O presente foi meu. Todo e absolutamente meu. :D O privilégio de ter tanta gente fina, elegante e sincera viajando comigo Europa afora, acompanhando as minhas crises existenciais e lendo os meus absurdos posts de viagem é só meu. (Falaí: viagem de trem de Florença a Pisa by Trenitalia comigo é muito mais interessante do que aquela chatura pastelone de Passione, néam?! :D) A felicidade na hora em que eu recebo um comentário inteligente, mesmo que seja questionando 200% do que eu escrevi, mas transparecendo que as minhas palavras fizeram essa pessoa pensar pelo menos 2 minutos, é só minha. E o resgate no brilho no olhar, na busca de ver as coisas sob uma perspectiva diferente, tentando ver como um assunto em potencial para o blog... é só meu.

Então tudo o que eu posso fazer é simplesmente o mais básico do básico.

Obrigado por me lerem, caros leitores. Muito obrigado. :)

10 comentários:

Daniel Cassus disse...

PARABÉNS! Agora deixa eu ser o 1º a comentar no seu 1º aniversário! Tô aqui perdendo a hora para ler o seu post. Acho que nenhum outro blog consegue me fazer ficar mais 10 minutinhos no computador quando eu já estou atrasado.

E eu também adorava Atlas. Nunca cheguei a ter um gigante, mas cogitei a hipótese de fazer Geografia. Felizmente, eu estalei e não fiz.

E muito obrigado pelos links, mas você vai ter que trocar tudo quando eu inaugurar o novo blog. :P

Thiago Lasco disse...

O prazer foi nosso! E o pupilo se saiu bem mais verborrágico do que o muso inspirador sequer poderia cogitar ;^)

tommie disse...

Brasileiro tem vocação pra migrante, junte-se isso a um olhar e narrativa peculiares, pronto, dá um blog prato cheio pras nossas sedes por vidas diferentes. Prost!

Lobo disse...

E passa rápido o ano né? E tudo parece que foi um flash, e a gente fica doido pra ter certas experiências de novo, e lembra o trabalho miserável que as coisas dão... Mas vale a pena. Tudo vale a pena. Ou não né, vai saber? ahauahauhau

Feliz Aniversário pro blog!

Abração Fernando!

Lucas disse...

Adoro seu blog, Fernando. Descobri ele por acaso - não lembro se foi alguém que recomendou ou se cliquei randomicamente nos links de algum dos blogs que vc citou - mais ou menos em Janeiro desse ano, quando eu ainda morava em Dublin. Não preciso dizer que super me identifiquei, né?

;)

Lobo disse...

Fernando, tudo certo pra você se for na Lapa, lá pelas 18h?

Will Moritz disse...

Parabéns Fernando! Você já construiu um espaço psico-literário incrível com seu blog. Quando li os primeiros posts disse que você levava jeito pra coisa! E a evolução do blog só demonstrou sua capacidade criativa e é, com certeza, um ótimo exercício mental. Os assuntos podem ser quotidianos, mas sua ótica é sempre muito particular.

Gui disse...

Uau, cara. Fico muito feliz de saber que você pensa assim!

Parabéns pelo aniversário do blog. Leio já há algum tempo e meu único pedido é: escreva com mais frequência. Gosto pra caralho de te ler, viu?

Abração!

Carol S. disse...

Primeiramente, PARABÉNS! São poucos os blogueiros que tem a incrível capacidade de escrever textos bons como os seus por tanto tempo.

Fiquei lembrando de como eu te "descobri". Estava prestes a viajar pra Europa e passava dias e dias procurando dicas pela Itália, até que encontrei seu post da viagem de trem de Florença a Pisa. AMEI de cara e não parei de te ler!
(Fiquei até inspirada em criar meu próprio blog pra tentar compartilhar com o mundo minhas percepções e "aventuras". E digo que é uma coisa complicada.)

Seus relatos sempre me deixam com uma vontade de aproveitar a vida, sair pelo mundo e correr atrás do que quero! Acho que mesmo com inúmeras crises existenciais, tudo vale a pena né.

Parabéns de novo, espero que você continue com seus insigths ácidos e super divertidos! =D
Beijão

railer disse...

parabéns, cara.
continue assim, te dou maior força!